terça-feira, 2 de junho de 2015

Costa do Marfim: Em ano de eleições

Pilhado e incendiado na sequência das violentas manifestações anti-francesas de 2004, o maior liceu francês de Abidjan, centro comercial da Costa do Marfim, reabriu oficialmente as suas portas esta semana, depois de 11 anos de encerramento. E a reabilitação custou 11 milhões de euros. O país, que no original se intitula Cote d'Ivoire, manteve fortes laços com a França depois de se ter tornado independente, em 1960. O desenvolvimento da produção do cacau para exportação e o investimento estrangeiro fizeram dele um dos mais prósperos da África Ocidental, mas não o protegeram de alguma agitação política. Em Dezembro de 1999, um golpe militar derrubou o Governo; e o líder da junta que se seguiu, Robert Guei, deturpou as eleições efectuadas em finais de 2000, proclamando-se ilegalmente vencedor. Mas o protesto popular obrigou-o a retirar-se e levaram ao poder o historiador socialista Laurent Gbagbo. Depois, políticos da oposição e militares desencantados tentaram novo golpe em Setembro de 2002, do que resultou uma rebelião e uma guerra civil, que terminou em 2003 com o país partido ao meio: os rebeldes no controlo do Norte e o Governo no Sul, com uma zona tampão entre eles. Em Março de 2007, o Presidente Gbagbo e o antigo líder rebelde das chamadas Forças Novas, Guillaume Soro, assinaram um acordo pelo qual este último passava a ser primeiro-ministro. Mais tarde, nas eleições de Novembro de 2010, o liberal Alassane Dramane Ouattara ganhou, mas Gbagbo não aceitou passar-lhe o testemunho, pelo que tivemos cinco meses de impasse. Até que, em Abril de 2011, depois de muita luta, Gbagbo foi à força afastado do poder por partidários de Ouattara, antigo quadro do Fundo Monetário Internacional (FMI). Milhares de capacetes azuis das Nações Unidas e centenas de soldados franceses ficaram na Costa do Marfim, para garantir que a situação se iria normalizar, de acordo com o desejo do FMI, dos Estados Unidos e de outras instâncias. O triunfo do liberalismo O desejo do liberal Ouattara, muito amigo de Nicolas Sarkozy, é reconstituir as infraestruturas de uma antiga colónia que teve como primeiro Presidente Félix Houphouet-Boigny, aquele que transferiu a capital de Abidjan para a sua terra natal, Yamassoukro, onde ergueu uma catedral à imagem e semelhança da de São Pedro, em Roma. Muitos dos partidários do Professor Laurent Gbagbo refugiaram-se no vizinho Ghana, enquanto ele se encontra na Haia, a aguardar julgamento pelo Tribunal Penal Internacional. As próximas eleições presidenciais vão ser em Outubro, com probabilidade de reeleição de Ouattara, apadrinhado pela grande finança internacional, que o considera um homem providencial e o salvador de um país que andava à deriva, nos tempos do socialista Gbagbo. Ele é um homem do Norte, com laços ancestrais ao Burkina Fasso, que antigamente se chamava Alto Volta. Nasceu em Dimbokro, no centro, em 1942, e aos 20 anos terminou o liceu em Ouagadougou, a capital burkinabe. Depois, com uma bolsa norte-americana, prosseguiu os estudos nos Estados Unidos, tendo-se doutorado em ciências económicas na Universidade da Pensilvânia, em Filadélfia. Seguiu-se a entrada no FMI, em Washington, no ano de 1968. Cinco anos mais tarde, Ouattara foi recrutado para o Banco Central dos Estados da África Ocidental (BCEAO), que tinha então a sede em Paris, antes de em 1978 a haver transferido para 1978. O socialista Gbagbo Quanto ao antigo Presidente Gbagbo, nasceu dia 31 de Maio de 1945 em Gagnoa, numa família católica, e estudou História na Universidade de Abidjan, depois do que passou para a Sorbonne, em Paris, de onde saiu para leccionar na Costa do Marfim, onde se envolveu em actividades políticas que em 1971 o levaram à cadeia. Em 1980 Gbagbo passou a director do Instituto de História, Arte e Archeologia Africana da Universidade de Abidjan, depois do que formou a Frente Popular Marfinense e passou pelo exílio na França, onde contava com toda a simpatia e solidariedade do Partido Socialista. Em Abril de 1990 o histórico Houphouët-Boigny, do qual Alassane Dramane Ouattara chegou a ser primeiro-ministro, reconheceu os partidos da oposição e marcou eleições multipartidárias, que ganhou, mas em 1993 viria a morrer, tendo-lhe sucedido o ministro das Finanças, Henri Konan Bédié, que em 1999 foi deposto pelo golpe do general Robert Gueï. É assim, com uma séria de acidentes de percurso, que tem vindo a decorrer a vida do maior produtor mundial de cacau.