quinta-feira, 7 de maio de 2015

Togo, um país infeliz

As eleições presidenciais nada mudaram num território que o explorador Gustav Nachtigal anexou em 1884 em nome do imperador da Alemanha e ao qual deu o nome de Togo, que era apenas o de uma aldeia. O pequeno país continua a ser um dos mais infelizes ao cimo da Terra. Jorge Heitor ________________________________________ O Tribunal Constitucional do Togo confirmou que o Presidente cessante, Faure Essozimna Gnassingbé, conseguiu um terceiro mandato, com 58,77 por cento dos votos expressos, numa eleição realizada dia 25 de Abril, tendo derrotado, entre outros, o líder da oposição, Jean-Pierre Fabré, de 62 anos, que liderava a coligação Combate por uma Alternância Pacífica (CAP 2015). Esta vitória faz com que a mesma família acabe por continuar no poder durante mais de meio século, dado que Gnassingbé é Presidente desde 2005, tendo sucedido a seu pai, Eyadema, que estivera 38 anos na chefia de uma unidade territorial que chegou a fazer parte da colónia modelo do antigo império colonial alemão. O Tribunal Constitucional disse que Fabré obteve 35,19 por cento dos votos, indo o resto para os demais candidatos, que à partida já se sabia que não iriam ter qualquer hipótese: Aimé Tchabouré Gogué (ADDI), Gerry Taama (NET) e Mohamed Tchassona Traoré (MCD) obtiveram 4,03 porcento, 1,03 porcento e 0,90 porcento dos sufrágios, respectivamente De nada serviu Jean-Pierre Fabré ter considerado os resultados fraudulentos; e no Togo não existe qualquer limite legal para o número de mandatos que um Presidente pode ter, de modo que o actual status quo se poderá arrastar ainda durante muito tempo. De pai para filho Faure Gnassingbé é filho de uma senhora do Sul do país, Sabine Mensah, e de um Presidente no Norte, o velho ditador Eyadema Gnassingbé, tendo nascido em 6 de Junho de 1966, predestinado a dar continuidade a uma dinastia que começara em Abril de 1967. Tendo passado pela academia militar de Saint-Cyr e pela Universidade Paris-Dauphine, na França, o homem agora reeleito Presidente do Togo é titular de um Master of Business Administration (MBA) obtido na Universidade George Washington, dos Estados Unidos. Em 1999 foi eleito deputado por um círculo do centro do pequeno país, tendo ido logo parar à presidência da comissão parlamentar de Relações Exteriores e de Cooperação, para em 2003 conseguir ser reeleito deputado o obter o lugar de ministro do Equipamento, das Minas, dos Correios e das Telecomunicações. Era aí que estava quando o pai morreu, em 5 de Fevereiro de 2005; e o Exército colocou-o de imediato no poder, perante grande escândalo da comunidade internacional, que obrigou a que houvesse eleições, que ele naturalmente ganhou, dado o grande peso da máquina partidária do Rassemblement du peuple togolais (RPT), que fora criado em Agosto de 1967, como partido único. No entanto, de modo a que algo mudasse, para que tudo ficasse praticamente igual, o novo Presidente distanciou-se progressivamente do RPT e lançou, em Abril de 2012, a União para a República (Unir), com uma nova geração de ministros e de conselheiros. Foi aquilo a que se costuma chamar a renovação na continuidade; pouco mais do que uma operação de cosmética. 1,2 milhões de votos Faure Gnassingbé conseguiu agora 1,2 milhões de votos, face aos 692.584 do seu principal adversário, que falou de irregularidades havidas durante o escrutínio. Jean-Claude Codjo, da Comissão Nacional de Eleições, chegou a abandonar uma reunião, alegando "falta de transparência" em todo o processo. Mas nada disso impediu que o herdeiro do velho general Eyadema continue em cena por mais cinco anos, pelo menos, no âmbito de um esquema de perpetuação que conhecemos numa série de outros países africanos, como o Chade, os Camarões, Angola ou o Zimbabwe. A afluência às urnas foi de apenas 40 por cento, uma vez que a maioria da população já nem acredita muito na forma como as coisas se processam, numas terras que em Agosto de 1914 foram conquistadas aos alemães por forças franco-britânicas, numa campanha militar de escassas três semanas. Depois da II Guerra Mundial, a parte do Togo que estava a ser administrada pelo Reino Unido juntou-se à Gold Coast, para dar o Ghana, enquanto o território sob tutela francesa se tornou independente em 27 de Abril de 1960. Os primeiros anos de vida da República foram dominados por dois políticos, Sylvanus Olympio e Nicolas Grunitsky, até que em 1967 ela se tornou um feudo da famíla Gnassingbé. O país mais infeliz Num relatório internacional sobre felicidade, recentemente elaborado por um catedrático canadiano, um norte-americano e um britânico, o Togo é considerado o mais infeliz dos 158 países analisados, talvez pela falta de uma verdadeira democraticidade; e até porque, entre uma série de outros factores negativos, não existem empregos suficientes. O Produto Nacional Bruto per capita cifra-se nuns míseros 380 dólares (muito inferior ao do Quénia, de Marrocos, da Nigéria ou da África do Sul). Tendo a norte o Burkina Faso, a ocidente o Ghana e a leste o Benin, o Togo, com os seus escassos 57.000 quilómetros quadrados e a capital em Lomé, tem 6,7 milhões de habitantes (3,5 milhões de eleitores) e um clima tropical, sub-sariano, dependendo essencialmente da agricultura. Tendo em conta que já fez parte de uma colónia alemã e que depois esteve sob tutela de outras potências europeias, ainda não conseguiu desenvolver uma autêntica e sólida unidade nacional, até porque nele vivem perto de 40 grupos étnicos, a começar pelo Ewe, que representa 32 a 40 por cento da população e que domina o Sul. Um pouco mais de metade dos togoleses professam crenças indígenas, 29 por cento são cristãos e 20 por cento muçulmanos, havendo ainda um longo trabalho a fazer para superar todas estas clivagens, tanto as linguísticas como as religiosas. A etnia Kotokoli predomina no Centro e a Kabye (22 por cento da população) no Norte. As línguas do país correspondem às divisões étnicas, sendo a Ewe (ou evhé) a língua veicular no Sul, a parte mais aberta ao exterior; mas o francês tem vindo a ser progressivamente compreendido e falado nos últimos 50 anos. O factor racial Um dos motivos porque Jean-Pierre Fabré não conseguiu chegar a constituir uma alternativa de peso a Gnassingbé é o de ser mestiço, filho de um pai de origem francesa e de uma mãe togolesa, numa África Negra onde muitas vezes a miscigenação não é bem vista. Toda a sua carreira foi feita à sombra do adversário histórico dos Gnassingbé, Gilchrist Olympio, filho do Presidente Sylvanus Olympio, assassinado em Janeiro de 1963, no decurso de um golpe de estado, protagonizado pelo então sargento Etienne Eyadema e que colocou na chefia do Estado Nicolas Grunitsky. Eyadema, que viria a trocar o nome pouco africano de Étienne pelo de Gnassingbé, ficou então na sombra, por quatro anos, até que em 1967, já tenente-coronel, deu novo golpe e ficou ele mesmo como senhor todo poderoso, sem qualquer sombra de dúvida. A vitória acabou por caber, uma vez mais, à política de nacionalismo económico e cultural herdada do RPT, o partido do velho general Eyadema, que com a Nigéria promoveu a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), cuja carta foi assinada em Lomé, por 16 países, no ano de 1976. Foi sob pressão internacional que em 1993 o ditador legalizou os partidos da oposição e convocou eleições formalmente multipartidárias, que arranjou maneira de ganhar, com 96 por cento dos votos oficialmente expressos. Os 55 quilómetros de litoral togolês situam-se integralmente na região que no século XVII foi baptizada como Costa dos Escravos; e, por ironia do destino, os togoleses hoje em dia já não são de forma alguma escravos dos ingleses e holandeses de antanho, mas sim cativos de uma família política que se instalou no poder durante a década de 1960 e que parece não fazer a mínima intenção de o deixar tão depressa. 7 de Maio de 2015

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