segunda-feira, 24 de agosto de 2015

O fluviário de Mora

O fluviário do Cabeção, no concelho de Mora, junto ao açude e ao parque de merendas do Gameiro, é uma das grandes maravilhas do Alentejo nestes últimos tempos. Visitei-o ontem, no primeiro dia de abertura ao público; e adorei, principalmente por se tratar de um novo equipamento no interior da terra alentejana, de que tanto desenvolvimento necessita. Que Portugal não seja só Lisboa, Porto, Algarve e a ilha da Madeira, mas sim múltiplos polos de interesse para todos os nacionais e estrangeiros – é o que é preciso. Os esturjões de olhos muito brilhantes, as piranhas, as lontras e tudo o mais que se pode encobrar no Fluviário de Mora, no sítio do Cabeção, merece bem que se percorram 170 quilómetros e se reservem três ou quatro horas do nosso tempo para o ir apreciar. Jorge Heitor 23 de Março de 2007

Bilhete a todos os que me humilharam

Sempre à minha frente encontrei homens e mulheres de outra condição. Mais altos, quiçá mais belos, mais ricos e muito mais poderosos. Eu, como todos os que se sentem por baixo, oprimidos, sempre encontrei homens e mulheres prontos para me dirigirem e para me indicarem o caminho; para me dizerem o que deveria ou não deveria fazer. Pessoas bem encaixadas na vida ou com muito mais ousadia ou descaramento, prontas para me suplantarem e oprimirem. Sempre me senti "underneath what is above", conforme um dia sonhei, creio que no ano de 1976, na cidade de Londres, um dos muitos lugares onde sofri desilusões, de vária ordem. Vi-me como um palhaço pobre, um faz-tudo; e a imagem tinha essa legenda. É a todos os que um dia me passaram a perna que hoje dedico este apontamento, na manhã de 11 de Setembro do ano 2007. Jorge Heitor

sábado, 22 de agosto de 2015

Resolução do Bureau Político do PAIGC

Nos dias 21 e 22 de Agosto, sob a presidência do Camarada Domingos Simões Pereira, Presidente do Partido, e em observância da alínea b) do Artº33 dos Estatutos, reuniu-se extraordinariamente o Bureau Político (BP) do PAIGC, com a seguinte ordem dos trabalhos: Análise e avaliação da situação política partidária à luz dos últimos acontecimentos; Diversos. A ordem dos trabalhos foi aprovada por maioria de votos dos presentes. SOBRE A ANÁLISE DA SITUAÇÃO POLITÍCA O Presidente do partido informou ao Bureau Politico que foi completamente inesperado e pelos órgãos de comunicação social que o partido tomou conhecimento de um decreto presidencial que nomeou o Senhor Baciro Djá como Primeiro Ministro da Guiné-Bissau, numa altura em que se aguardava a chegada ao país de uma importante delegação da CEDEAO, seguindo os esforços empreendidos pela mais alta esfera da comunidade internacional, nomeadamente pelo Secretário Geral das Nações Unidas e por outros Chefes de Estado. O Bureau Politico procedeu a uma analise profunda da situação politica vigente no pais, onde se destacou os apelos à coesão, unidade, espirito de reconciliação como condições indispensavéis para preservar o Partido de divisões e fracturas que têm marcado a vivência política nacional. O Bureau Politico criticou de forma veemente o caminho da inconstitucionalidade escolhido para demitir o governo constitucional do PAIGC quando existiam condições objectivas e de interesse nacional para se ultrapassarem as divergências invocadas por via do dialogo, principalmente no aspecto do relacionamento entre o Presidente da Republica e o Primeiro Ministro. O Bureau Politico considerou que o Camarada Baciro Dja ao aceitar a nomeação e investidura no cargo de Primeiro-ministro, a revelia da constituição e dos estatutos do PAIGC, violou o dever do militante plasmado na alínea o do artigo 15º dos Estatutos. O Bureau Politico considerou igualmente que essa atitude do Camarada Baciro Dja põe em causa mais uma vez os superiores interesses do partido, da sua unidade e coesão interna. Diversos No capítulo dos diversos, os membros do Bureau Politico tiveram a oportunidade de prestar alguns esclarecimentos sobre assuntos diversos. Assim, após profunda analise da situação politica vigente no pais, agravada com a recente nomeação do novo Primeiro-ministro a margem das normas constitucionais e internas do PAIGC, O Bureau Politico delibera: Condenar veementemente, a decisão do Senhor Presidente da Republica em nomear através do Decreto Presidencial 6/2015 um novo Primeiro-ministro, a revelia da Constituição da Republica e com total desrespeito pelos Estatutos do PAIGC, partido vencedor com maioria absoluta das ultimas eleições legislativas; Apelar ao restabelecimento da legalidade constitucional por via da anulação do decreto presidencial nº 6/2015 e convite ao PAIGC para, em observância dos seus Estatutos e priorizando a via negocial, encontrar uma solução que assegure a paz, a estabilidade e a unidade nacional; Exortar o Camarada III Vice-presidente a assumir a atitude militante de facilitar o processo de dialogo demitindo-se do cargo para que fora nomeado e empossado inconstitucionalmente e sem o necessário aval prévio do partido, sob pena de infracção grave, conforme plasmado no artigo 103 dos Estatutos: “São consideradas condutas de grave traição politica aos princípios do PAIGC, a violação activa ou passiva directa ou indirecta pelo militante, dos seus deveres estatutários, dispostos nas alíneas j, l, n, o, e p do artº 15 dos Estatutos”; Expressar o seu profundo lamento pelo facto de três moções de confiança ao governo do PAIGC, aprovados por unanimidade e num gesto de elevado patriotismo, pela Assembleia Nacional Popular, não terem merecido nenhuma consideração por parte de Sua Excia. o Presidente da Republica antes da decisão de exoneração do Chefe do Governo e consequente queda do executivo; Instruir as estruturas competentes do partido a accionarem todos os mecanismos legais e políticos com vista a reposição da legalidade constitucional e democrática; Encorajar o Conselho Nacional de Jurisdição a prosseguir a sua acção disciplinar contra todos os que incorram na infracção do artigo 15º alínea o) dos Estatutos do Partido, que reza: E dever de todo o militante do partido ”não apresentar candidatura a qualquer cargo electivo do Estado ou nas Autarquias e não aceitar o exercício de qualquer função governativa, fora do quadro previsto nos presentes estatutos e regulamentos”. Manter em aberto e reforçar os mecanismos de dialogo com Sua Excelência o Senhor Presidente da Republica e com os demais órgãos da soberania, demonstrando o interesse e a disponibilidade do partido em priorizar a via do dialogo construtivo; Expressar todo o seu apreço e enorme satisfação, ao mesmo tempo que encorajar ao reforço das grandes manifestações de solidariedade tanto a nível interno como internacional, em exigência ao respeito do primado da legalidade, como condição de se preservar a paz e a estabilidade no país. Apelar aos militantes, simpatizantes e o povo guineense, em geral a manterem-se atentos e determinados a defenderem as conquistas democraticas e o respeito pela legalidade constitucional. Agradecer o empenho com que a Comunidade Internacional tem seguido os desenvolvimentos da situação politica e enaltecer os esforços continuados do Secretario Geral das Nações Unidas, dos Chefes de Estado da CEDEAO, nomeadamente dos Presidentes do Senegal, da Guiné-Conacry e da Nigéria, e mantê-los informados sobre todas as questões que se prendem com as decisões politicas que vão sendo assumidas pelos diferentes intervenientes políticos e que consubstanciam as bases para preservar os valores consagrados na Constituiçao e demais leis da Guiné-Bissau; Encorajar a Direcção do Partido a prosseguir e alargar os contactos junto dos parceiros internacionais, nomeadamente com a CEDEAO, a CPLP, a UA, a UE e o sistema das nações unidas; Reiterar as deliberações da última sessão do Bureau Politico referentes a retoma do diálogo e a reposição da legalidade democrática e constitucional. O Bureau politico se congratula com a forma serena, mas aberta e franca como os debates se desenrolaram, o que permitiu a cada responsavél defender os seus pontos de vista e no final, colocar os interesses colectivos e do partido em primeiro lugar. Bissau, 22 de Agosto de 2015 O Bureau Politico

Guiné-Bissau: Um Estado virtual

O Conselho de Segurança das Nações Unidas manifestou-se, obviamente, preocupado com a actual crise política na Guiné-Bissau, mais uma de tantas, e pediu aos diferentes órgãos de soberania, claro, o que parece ser quase impossível: o diálogo e o consenso na resolução das suas divergências. Diálogo e consenso são coisas de que normalmente os políticos guineenses se têm mostrado incapazes, desde os tempos em que alguns guerrilheiros preferiram facilitar a vida às autoridades coloniais a terem um diálogo sério com Amílcar Cabral sobre as divergências existências quanto à melhor forma de a Guiné se poder tornar independente. Diálogo foi o que faltou ao relacionamento do primeiro comissário (primeiro-ministro) João Bernardo Vieira, "Nino", com o Presidente Luís Cabral, tendo preferido derrubá-lo e forçá-lo ao exílio. Diálogo foi o que faltou a "Nino", já depois de ter chegado à chefia do Estado, com o primeiro-ministro Victor Saúde Maria, que mandou colocar em prisão domiciliária. Diálogo foi o que faltou ao brigadeiro Ansumane Mané para se procurar entender com "Nino", sem a necessidade de se colocar à frente de uma Junta Militar e de fazer largos meses de guerra a um Presidente que, para tentar sobreviver, pediu a ajuda do Senegal e da República da Guiné. Estes são apenas alguns dos múltiplos exemplos das ocasiões em que os guineenses não souberam dialogar, antes avançando para o achincalhamento, para a traição e para outras práticas muito pouco democráticas. Vem-nos agora dizer o antigo Presidente timorense José Ramos-Horta, que já representou em Bissau o secretário-geral das Nações Unidas, que a crise resulta "de uma Constituição que foi cozinhada em Portugal, sem qualquer consideração à realidade social da Guiné-Bissau, mas encomendada e absorvida na Guiné-Bissau, logo a seguir ao derrube do Presidente Luis Cabral". A partir desse primeiro golpe, o de "Nino" Vieira contra Luís Cabral, a Guiné-Bissau nunca mais conheceu paz. Mas, como o próprio Ramos-Horta foi capaz de reconhecer, esse modelo constitucional não desculpa tudo. Claro que não desculpa, pois que já no tempo da luta armada havia fortes conflitos, com certos combatentes mais interessados numa Guiné que fosse só para negros do que em trabalhar com os comandantes cabo-verdianos que se haviam prestado a estar com eles numa causa comum. O mal é muito antigo e tem algo a ver, conforme já o cheguei a sublinhar, com o facto de não haver muito mais gente alfabetizada, para se poder alargar o leque das escolhas possíveis para a governação do frágil país. A falta de um número maior de quadros e de cidadãos devidamente letrados, que não se deixassem arrastar em aventuras, sejam elas conduzidas por caudilhos militares ou civis, poderá explicar a agitação quase permanente que se vive na Guiné-Bissau, uma terra que devidamente aproveitada até dava para todos viverem de uma forma aceitável. Como o regime colonial não teve o cuidado de alfabetizar 15 ou 20 por cento da população que fosse, e como nas primeiras décadas da independência não se generalizou a alfabetização, que deveria ter sido em massa, chegamos a esta altura da História com um grande défice de cultura cívica. Ainda há muitos guineenses a pensar, em primeiro lugar, como balantas, manjacos ou mandingas, e não como cidadãos de um país novo que importa levar para a frente, recorrendo aos múltiplos recursos naturais de que dispõe, como o petróleo, o ouro, os fosfatos e as bauxites. Só assim se explica, pela ausência de 100 ou 200 bons políticos, credíveis, formados em devido tempo, e não à pressa, que tenhamos na Presidência da República da Guiné-Bissau um senhor que não é capaz de estabelecer consensos com a Assembleia Nacional Popular nem com a direcção dos principais partidos políticos. Quando o Presidente José Mário Vaz demitiu o primeiro-ministro Domingos Simões Pereira e foi chamar para o seu lugar um polémico indivíduo chamado Baciro Djá ficou patente que este deveria ter muita dificuldade em constituir equipa, à margem das pessoas que nos últimos dois ou três anos já têm passado pelo Governo. Apertado, isolado, temendo pela vida, bem poderá José Mário Vaz solicitar ao seu vizinho setentrional, o Senegal, que lhe envie tropas de elite, a protegê-lo a ele e ao seu novo e quiçá efémero primeiro-ministro. Não é assim que se resolvem as situações, alheando-se do sentimento da maioria da população e pedindo a alguns estrangeiros que nos protejam, com a eventual promessa de que também nós iremos proteger os seus interesses, nomeadamente na exploração de recursos nas águas que nos são comuns. Se José Mário Vaz e Baciro Djá só conseguirem ficar nos seus lugares sob a protecção de uns quantos comandos senegaleses, muito mal vai a Guiné-Bissau, uma vez mais. E de nada lhe servirão os muitos apoios que lhe foram prometidos durante a mesa redonda de Bruxelas. Teria sido tudo em vão, tanto o afastamento dos militares golpistas como as eleições do ano passado e a tão elogiada mesa redonda. Tudo fogo fátuo. Num território onde a crise parece ser a forma permanente de vida, só aqui e ali intervalada por uns ténues lampejos de esperança. É esta a triste realidade!

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Meu sangue latino

A playa de Matalascañas foi uma das minhas descobertas do início dos anos 80, pois lá passei um dia e uma noite (na pensão Abelardo). Também conhecida por playa de Castilla, à beira das marismas do Guadalquivir e do Santuário de El Rocio. Ficou-me gravada no coração, tal como Antequera, la plaza de toros de Ronda (a mais antiga de Espanha), Córdoba, Granada, Ceuta...Europa, minha pátria, que tanto amo, cuando estoy de ti lejos...Quisera ser tanta coisa em tanto lado! Ir cortar o cabelo a Almeria, fazer amor em Sevilha, ver nevar em Copenhaga. Um dia subi a um monte, perto de Oslo, e fiquei a olhar a paisagem. Quando conheci Amesterdão senti-me velho. Em Dusseldórfia comi carne de porco. Em Berlim passeei pela floresta, em Grunewald. Saudade. Em Formentera a água estava tão quente que mal me lembro de outra assim. Em Aix-e-Provence tomei café sob os plátanos. Saudade. No Chateau d'IF visitei a cela do abade Faria. Em Buenos Aires, aonde nunca fui, palpita o meu sangue latino. Eis um retrato de mim, Jorge, 1971/1985

terça-feira, 11 de agosto de 2015

E agora, eu?

Se tento comunicar-me, o que há é apenas a noite e uma espantosa solidão. Assim escreveu Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e assim o penso, o sinto, muitas vezes eu. Devo seguir até ao enjoo? Posso, sem armas, revoltar-me? perguntou o poeta mineiro, que um dia chegou a ler uns parcos versos meus, que lhe foram mostrados por um amigo comum, o Eduardo Chianca de Garcia. E com essas perguntas me identifico. Em vão me tento explicar, os muros são surdos. Que poderia ele; e que posso eu fazer? Perdi os melhores amigos. Já não tento qualquer viagem. "Sinto que o tempo sobre mim abate sua mão pesada. (...)Uma aceitação maior de tudo, e o medo de novas descobertas". Se eu pudesse recomeçar os meus dias! Usar de novo a minha adoração pelos deuses que tive. "Vejo tudo impossível e nítido". E depois das memórias vem o tempo trazer novo sortimento de memórias, até que, fatigado, me recuso, como ele, e não saiba já se a vida é ou se de facto foi. E agora, José? E agora, Carlos? E agora, eu? Jorge Heitor 30 de Novembro de 2014

Figo: Jogadas africanas

Foi um encontro casual. Luís Figo ia para Angola e Veríssimo Nancassa, ex-ministro guineense e antigo quadro do Banco Mundial, preparava-se para embarcar para Dacar, no Senegal. Os dois cruzaram-se na zona lounge do aeroporto de Lisboa. “Já nos conhecíamos e cumprimentámo-nos. Em conversa disse-- lhe que estava no sector das minas e ele respondeu que já tinha pensado investir na área. Nasceu assim uma parceria”, recorda à SÁBADO o actual sócio do ex-futebolista, a partir da capital senegalesa. Pouco mais de três anos depois desse encontro, a empresa que Luís Figo criou em 2010, a Damash Minerals, tem duas concessões no Senegal, quatro na Guiné-Conacri e está em negociações com os governos do Burquina Faso, Mauritânia, Mali e Brasil. A entrada de Figo no sector mineiro terá acontecido no fim de 2009. “Na época eu estava a trabalhar com a West Africa Mining Holding e, como ele ficou interessado, convidámo-lo a fazer parte da empresa”,diz Veríssimo Nancassa. A holding alemã, sediada em Zug, na Suíça, controlava e tinha participações em várias empresas com explorações no Senegal e na Guiné-Bissau. Em Março de 2010, a própria companhia anunciou que o ex-futebolista se comprometeu a adquirir 11% da holding através da sua firma, a DamafhSGPS, e que seria eleito para a comissão executiva do grupo. Em Abril desse ano,o futebolista terá chegado a participar no Salão Internacional das Minas, em Dacar, como representante do grupo. No entanto, a compra acabou por não se realizar. “Houve contactos e negociações, mas o negócio nunca se concretizou”, diz à SÁBADO Luís Figo, através do seu advogado. NO ENTANTO, O INTERESSE do futebolista pela área aumentou. “Luís Figo estudou várias possibilidades de negócio que lhe foram surgindo na área de exploração mineral, na componente de minérios e na petrolífera”, explica o advogado. A 29 de Junho de 2010,registou na conservatória do registo comercial de Almada a sociedade Damash Minerals – Exploração Mineira, Lda., com sede na Rua Mário Botas,na Aroeira, dedicada à prospecção, extracção, preparação e exploração de minérios metálicos e à importação,exportação, distribuição e venda dos respectivos produtos. (...) NUNO TIAGO PINTO/Sábado 2012

Fidel faz 89 anos

Todos os homens sonham, mas não sonham de igual modo. E um dos que mais sonhou, neste último século, foi Fidel Castro Ruz, de ascendência galega, oriundo de uma família que vivia no Noroeste da Península Ibérica e que a dada altura emigrou para Cuba, nas Caraíbas. Fidel, que faz agora 89 anos, derrotou o ditador Fulgêncio Batista, enfrentou os Estados Unidos e libertou o povo cubano da subordinação ao grande vizinho norte-americano. O galego, que vive da terra e do mar, a norte do rio Minho, é por natureza um sonhador, um homem que vai muito além do Cabo Finisterra e que leva a sua vivência ao resto do mundo. "Galiza ficas sem homens que possam colher teu pão", escreveu a poetisa Rosalía de Castro, ao falar do grande drama da emigração, que só no ano de 1853 atirou com dois milhões de galegos para as Américas, devido à seca e à crise agrícola, que se fazia sentir naquela parte da Espanha. Foi nessa Galiza devastada que em 4 de Dezembro de 1892 nasceu Angel Castro, pai de Fidel. E dela partiu, aos 20 anos, para ir combater pela Espanha, em Cuba, contra os norte-americanos. Depois, em 13 de Agosto de 1926, às duas da manhã, no meio de um grande ciclone, nasceu Fidel Alejandro Castro Ruz: "Nasci guerrilheiro, porque nasci a meio da noite", contaria ele um dia a Frei Betto, sacerdote brasileiro. Como a mãe não foi a esposa oficial do pai, María Louisa Argota, mas sim uma empregada da casa, Lina Ruz, Fidel desenvolveu desde pequeno um certo sentimento de clandestinidade, que o levaria a lutar contra os poderes instituídos e a procurar forjar uma cultura cubana totalmente nova, de que o mundo inteiro viesse a falar. Filho espiritual de José Martí, herói da independência, Fidel nunca teve verdadeiramente uma fé religiosa, porque toda a sua força foi concentrada na aquisição de uma fé política, inabalável, que faria mover montanhas, até os Estados Unidos compreenderem, de uma vez por todas, que Cuba nunca se iria vergar aos seus intentos. Dias depois de ter entrado na Havana, vencedor, depois dos anos de guerrilha, Fidel tinha uma aura equiparável à de Cristo. Ele era o Messias de um tempo novo, o herói de Sierra Maestra, o chefe que tantos iriam admirar, tanto na América Latina como na África e na Ásia. Muito mais tarde, em Agosto e Setembro de 1975, Fidel enviou para Angola alguns dos mais importantes oficiais das suas Forças Armadas, de modo a que o MPLA não fosse derrotado pela FNLA, pela UNITA ou pela África do Sul. E quando chegou Novembro já não eram só oficiais, mas sim batalhões inteiros. El Comandante assistiu à partida de barcos e barcos carregados de soldados, para que Angola fosse verdadeiramente independente e dirigida por António Agostinho Neto; e não por Holden Roberto ou por Jonas Malheiro Savimbi. Na Primavera de 1977, Fidel Alejandro Castro Ruz fez uma viagem triunfal à Argélia, Líbia, Iémen do Sul, Somália, Etiópia, Tanzânia, Moçambique e Angola. "Os sentimentos irão para além dos estreitos horizontes das fronteiras de um país", disse então "O Príncipe da Guerrilha", como lhe chamou Georgie Anne Geyer, num livro publicado em 1991 em Boston, Toronto e Londres. Hoje em dia ele já não é mais o chefe formal de Cuba, devido à idade avançada; mas continua a reflectir sobre o que se passa pelo mundo fora e a publicar artigos sobre os principais problemas da humanidade. Jorge Heitor 11 de Agosto 2015