sábado, 12 de dezembro de 2015

Samakuva reeleito presidente da UNITA

Entre 3 e 5 de Dezembro, decorreu nos arredores de Luanda o XII Congresso da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA). Com 82,8% dos votos, Isaías Samakuva foi reeleito presidente do ‘Galo Negro’ pela quarta vez. Escolhido pelos delegados pela primeira vez em 2003, Samakuva lidera a UNITA ininterruptamente há 12 anos e prepara-se agora para se candidatar, uma vez mais, à presidência de Angola nas eleições gerais previstas para Agosto de 2017. Dito por outras palavras, desde a morte de Jonas Savimbi, em Fevereiro de 2002, que em tempos de paz a UNITA só conheceu um líder.1 Correndo o risco de comparar o que não é comparável, importa assinalar que a resiliência política de Samakuva na liderança da UNITA é relativamente semelhante à de José Eduardo dos Santos à frente do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). Mas se a longevidade de José Eduardo dos Santos é relativamente fácil de compreender, o mesmo não se pode dizer da resiliência de Samakuva. No essencial, mas não em exclusivo, a 1 Samakuva enfrentou sempre candidaturas alternativas. Em 2003 derrotou Lukamba Gato e Dinho Chingunji; em 2007 venceu Abel Chivukuvuku; em 2011 derrotou José Pedro Kachiungo. Desta vez enfrentou Lukamba Gato, uma vez mais, e Abílio Kamalata Numa. A longevidade de José Eduardo dos Santos assenta na distribuição eficaz das benesses decorrentes do exercício do poder político. De certo modo, o MPLA é o Estado e o Estado é o MPLA, sendo que José Eduardo dos Santos é quem tutela de forma exímia todo o processo. Sem benesses para distribuir, a sobrevivência política de Samakuva na liderança da UNITA é mais difícil de explicar, mesmo tendo em conta que os últimos 12 anos não foram isentos de sobressaltos. Em Março de 2012, por exemplo, em ruptura com Samakuva, destacados dirigentes da UNITA, entre eles Abel Chivukuvuku, abandonaram o partido e fundaram uma nova força política, a Convergência Ampla de Salvação de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE). Esta importante cisão terá sido o mais duro golpe político que a UNITA enfrentou nos tempos mais recentes. Porém, com maior ou menor dificuldade, é um facto que Samakuva sobreviveu às hecatombes nas eleições legislativas de Setembro de 2008 e, mais recentemente, nas eleições gerais de Agosto de 2012. Em parte, por paradoxal que possa parecer, a explicação para as suas sete vidas políticas poderá estar na irrelevância da própria UNITA. Sem que seja previsível a ascensão da UNITA ao poder, o partido do ‘Galo Negro’ vive fechado sobre si próprio, sem grande capacidade de atracção de jovens quadros, e disso tira proveito Samakuva que, ao lon- 11 DE DEZEMBRO DE 2015 40 A reeleição de Samakuva: uma boa notícia IPRIS Comentário para José Eduardo dos Santos | 2 go dos anos, teceu uma elaborada teia de cumplicidades e de lealdades. De certo modo, a UNITA é um partido de nicho e de nicho continuará a ser no curto e médio prazo. Independentemente dos motivos que estão por detrás da sobrevivência política de Samakuva, a sua reeleição inequívoca não é uma boa notícia para a UNITA e para Angola. Mesmo tendo em conta que Samakuva contestou a forma como decorreram as eleições de 2012, não há nenhuma razão para acreditar que em 2017 a UNITA terá um desempenho político substancialmente muito diferente daquele que teve em 2008 e 2012. Incapaz de se renovar ao mais alto nível, a UNITA continuará a ser incapaz de agregar à sua volta os descontentes com a eterna presença do MPLA na liderança de Angola. Nessa medida, os fenómenos de contestação política contra José Eduardo dos Santos tenderão a manter uma natureza inorgânica, como é o caso do activista Luaty Beirão. Nesta altura, não é ainda claro se José Eduardo dos Santos pretende candidatar-se a um novo mandato presidencial. Em todo o caso, no limite a sua intenção ficará obrigatoriamente clarificada no VII Congresso do MPLA que se realizará em Agosto de 2016. Ironicamente, pode dizer-se que em sentido figurado a continuidade de Samakuva — e o que ela representa em termos de ausência de alternativas e de renovação da UNITA — é em parte um precioso seguro de vida para José Eduardo dos Santos. Ainda que Angola viva actualmente um ciclo económico adverso e muito difícil, com todas as implicações políticas e sociais que daí decorrem, a eventual reedição em 2017 do confronto eleitoral de 2012 — entre José Eduardo dos Santos, Isaías Samakuva e Abel Chivukuvuku — não terá, em circunstâncias normais, grande história para contar. Naturalmente, a perpetuação do MPLA no poder constitui um problema, mas no actual contexto político a UNITA e a CASA-CE não se afiguram como parte integrante de qualquer solução alternativa. | Paulo Gorjão IPRIS

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Isabel-Victoria da Motta

No seu vigésimo quarto livro, “Um copo cheio de vinho novo”, a escritora portuguesa Isabel-Victoria da Motta dedica-se à criação literária sobre a história verídica de uma mulher, Lydia, hoje “já de certa idade”. O que Isabel-Victoria realmente pretende abordar neste romance é o acordar espiritual de Lydia, que há tempos conheceu por acaso, em Montmartre, onde tem um estúdio. Vivendo actualmente entre Lisboa e Paris, a autora dos poemas de “Tantin, a raiva da tarântula” e dos contos “Bateu Asa, Voltou” já está nesta altura a preparar um novo romance, que se deverá chamar “A Certeza das Coisas”. Assim prossegue a carreira de quem diz escrever livros “para quem gosta de literatura”; e de vender muito, “sem precisar de escândalos ou cunhas”. A obra actualmente à venda, e que abre com um citação do Salmo 45, tem design gráfico, correcção e revisão de texto de Paulo Correia Nunes, capa de Telmo Bento e pesquisa histórica de Kenneth Saint-Jacques. Foi impressa na Gráfica Almondina, de Torres Novas e preenche 276 páginas. Poderá servir como introdução ao universo literário de uma mulher que em tempos, quando trabalhava no Teatro, no Cinema e na Televisão, com o nome de Isabel Mota, chegou a ser considerada por alguns “excêntrica e doida”. Hoje em dia, Isabel-Victoria é uma mulher que veste muito bem e que assina livros no Chiado, à porta da Bertrand, enquanto o Natal não chega. Depois, quando vier a Primavera, é muito provável que bata asas e vá uma vez mais até Paris, onde em 1989 se instalou.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Ceuta, por Xavier de Figueiredo

O livro "Ceuta primeira conquista de Portugal além-mar" é uma reconstituição histórica de um feito ou acontecimento que afirmou Portugal como nação que não se restringia ao espaço do Minho ao Algarve e lhe abriu as portas de um extenso império, que ia do Norte de África ao Extremo Oriente. Nesta obra, com um prefácio do almirante Vieira Matias, o jornalista Xavier de Figueiredo, colaborador da Prestígio, conta o início da expansão de Portugal na África, na Ásia e nas Américas, antes de se terem povoado a Madeira, os Açores e as ilhas de Cabo Verde. Aconteceu isso no reinado de D. João I, casado com a inglesa D. Filipa de Lencastre e pai de infantes tais como D. Duarte, D. Pedro, D. Henrique e D. Fernando. A casa real portuguesa era profundamente cristã e entendia ser seu dever levar ao continente africano a fé que professava, de modo a tentar conseguir um retrocesso dos muçulmanos, que na altura em que Portugal se formou ainda dominavam uma grande parte da Península Ibérica. Nesta edição da Monitorius, com ilustrações do contra-almirante João Braz de Oliveira, fala-se da nobreza e do brilho da cidade que os portugueses encontraram no litoral de Marrocos; e que ainda hoje se encontra adstrita a uma administração europeia, mais precisamente à espanhola. É, pois, um livro de grande importância, este em que se descreve a forma como frotas reunidas no Porto e em Lisboa passaram por Lagos, no Algarve, e tomaram finalmente Ceuta, onde causaram uma grande mortandade. O próprio rei D. João I e os seus filhos participaram na aventura, ao contrário do que acontece hoje em dia, quando ninguém vê um Presidente dos Estados Unidos ou da Rússia seguir à frente das tropas que são enviadas para os mais diversos territórios. São mais de 170 as páginas em que Xavier de Figueiredo, natural da província do Huambo, em Angola, nos fala de Ceuta, de Tânger e de Alcácer Quibir, três nomes muito associados a tudo o que se fez, durante mais de século e meio, para que Portugal procurasse controlar o Noroeste da África, desde o Estreito de Gibraltar até às alturas da Mauritânia. Ceuta viria a ser perdida por Portugal no século XVII, mas ficou como a memória de um povo que ousou ir mais além, não se contentando com as praias do Algarve, por mais belas que elas fossem. Ousou até poder, até à segunda metade do século XX, quando começaram a soprar impetuosamente os Ventos da Mudança e foi imprescindível descolonizar. É assim a História. Impérios que nascem, que se arrastam no tempo e depois morrem, para dar origem a outras realidades.

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

O julgamento de Hisséne Habré

Le président du tribunal spécial africain à Dakar a annoncé jeudi la suspension du procès de l'ex-président tchadien Hissène Habré jusqu'au 9 novembre. « L’audience est suspendue jusqu’au 9 novembre. La Cour mettra à profit ce temps pour revoir » ses dossiers, a déclaré le Burkinabè Gberdao Gustave Kam, président des Chambres africaines extraordinaires (CAE), à l’issue de l’audience de jeudi 29 octobre. L’audience du 9 novembre doit démarrer avec le témoignage du président de l’Association des victimes des crimes du régime de Hissène Habré (AVCRHH), Clément Abaifouta, a indiqué Gberdao Gustave Kam. Jeudi, le tribunal a écouté le témoignage de Robert Hissein Gambier, né en 1954. Il a affirmé avoir été arrêté en décembre 1985 à N’Djamena par des agents de la Direction de la documentation et de la sécurité (DDS, police politique sous M. Habré) puis détenu jusqu’en décembre 1990. Pris pour un « mercenaire libyen » « Ce qui m’a sauvé (de la mort), je restais devant la porte (où) il y avait un trou et je respirais de l’air frais », a indiqué M. Gambier selon lequel les détenus s’entassaient dans la cellule où il était détenu. Il a dit avoir été arrêté parce que pris pour « un mercenaire libyen », ce qu’il a démenti. Accusé de « crimes de guerre, crimes contre l’humanité et tortures » durant sa présidence au Tchad (1988-1990), Hissène Habré comparaît depuis le 20 juillet devant les CAE, créées en vertu d’un accord entre le Sénégal et l’Union africaine (UA), que l’accusé récuse. Celui-ci refuse de s’exprimer et de se défendre devant cette juridiction. Les audiences avaient ensuite été suspendues dès le lendemain de l’ouverture du procès pour permettre à des avocats commis d’office pour la défense de prendre connaissance du dossier, puis elles ont repris le 7 septembre. Un verdict en février ? Le procès devait initialement prendre fin le 28 octobre, mais il ira « très probablement jusqu’en février », a affirmé jeudi à l’AFP le porte-parole du tribunal spécial, Marcel Mendy, confirmant une information annoncée à l’AFP par une source au sein de la juridiction le 20 octobre. « Nous avons encore une vingtaine de témoins à auditionner à Dakar et d’autres qui sont à N’Djamena » avant les plaidoiries, a ajouté M. Mendy. Hissène Habré encourt entre 30 ans de prison ferme et les travaux forcés à perpétuité. Une commission d’enquête tchadienne a estimé que la répression durant sa présidence a fait 40 000 morts. Jeune Afrique

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

A poesia de Tony Tcheka

Aos guineenses, na terra e na diáspora, e aos numerosos amigos da Guiné-Bissau dedicou Tony Tcheka (pseudónimo de António Soares Lopes Júnior) o seu livro "Desesperança no chão de medo e dor", em Setembro lançado na Alemanha e em Portugal e em Outubro na própria cidade de Bissau. Inspirado na palavra do escritor uruguaio Mário Benedetti, segundo a qual um homem não se deve render, nem ceder, o autor de "Noites de Insónia na Terra Adormecida" e de "Guiné Sabura que Dói", surgidos respectivamente em 1996 e em 2008, entregou-nos mais 50 poemas, em português e em crioulo, para nos falar de uma Guiné-Bissau maltratada, onde por vezes nem sequer há energia eléctrica, nem água potável, a correr das torneiras. Tony Tcheka, que já foi director do jornal "Nô Pintcha" e correspondente tanto da BBC como do jornal PÚBLICO, de Lisboa, tenta, pela poesia, libertar-se da tão grande desesperança que ameaça os naturais da Guiné-Bissau, 42 anos depois de terem proclamado unilateralmente uma independência que teima em não florir tanto quanto se desejaria. Os seus poemas são um fruto da política menos correcta que se tem feito da terra onde nasceu Amílcar Cabral e onde foram assassinadas pessoas como o Presidente Nino Vieira. Neste livro, ilustrado por Ismael H. Djata e editado pela Corubal, de Bissau, notamos bem que o medo é o "traje que veste a alma" da Guiné-Bissau, onde ainda em Agosto o Presidente José Mário Vaz decidiu afastar o primeiro-ministro Domingos Simões Pereira e promover um Governo que só se aguentou 48 horas, até finalmente ser chamado como novo primeiro-ministro o veterano Carlos Correia. "O tempo passa./amassam-nos/bloqueiam as artérias/mantendo-nos fora/do espaço dos ponteiros do tempo./e o tempo passa ./e nós a sobra do prato vazio/definhámos...". O tempo vai passando; e os guineenses, resignados, desfazem-se no tempo que passa e ficam como náufragos, na terra adiada. Urge encontrar a canoa que leve a bom porto o povo guineense. É o que parece dizer-nos Tony Tcheka, de 63 anos, que já tem sido referenciado na França, no Brasil, na Alemanha e no Reino Unido. O livro de que desta vez aqui falamos inclui textos que sobre o poeta em questão escreveram Odete Semedo, Robson Dutra Unigranrio, Maria Estela Guedes, Arlinda Mártires Nunes, Moema Parente Augel e J. Adalberto Campato._

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

O fluviário de Mora

O fluviário do Cabeção, no concelho de Mora, junto ao açude e ao parque de merendas do Gameiro, é uma das grandes maravilhas do Alentejo nestes últimos tempos. Visitei-o ontem, no primeiro dia de abertura ao público; e adorei, principalmente por se tratar de um novo equipamento no interior da terra alentejana, de que tanto desenvolvimento necessita. Que Portugal não seja só Lisboa, Porto, Algarve e a ilha da Madeira, mas sim múltiplos polos de interesse para todos os nacionais e estrangeiros – é o que é preciso. Os esturjões de olhos muito brilhantes, as piranhas, as lontras e tudo o mais que se pode encobrar no Fluviário de Mora, no sítio do Cabeção, merece bem que se percorram 170 quilómetros e se reservem três ou quatro horas do nosso tempo para o ir apreciar. Jorge Heitor 23 de Março de 2007

Bilhete a todos os que me humilharam

Sempre à minha frente encontrei homens e mulheres de outra condição. Mais altos, quiçá mais belos, mais ricos e muito mais poderosos. Eu, como todos os que se sentem por baixo, oprimidos, sempre encontrei homens e mulheres prontos para me dirigirem e para me indicarem o caminho; para me dizerem o que deveria ou não deveria fazer. Pessoas bem encaixadas na vida ou com muito mais ousadia ou descaramento, prontas para me suplantarem e oprimirem. Sempre me senti "underneath what is above", conforme um dia sonhei, creio que no ano de 1976, na cidade de Londres, um dos muitos lugares onde sofri desilusões, de vária ordem. Vi-me como um palhaço pobre, um faz-tudo; e a imagem tinha essa legenda. É a todos os que um dia me passaram a perna que hoje dedico este apontamento, na manhã de 11 de Setembro do ano 2007. Jorge Heitor

sábado, 22 de agosto de 2015

Resolução do Bureau Político do PAIGC

Nos dias 21 e 22 de Agosto, sob a presidência do Camarada Domingos Simões Pereira, Presidente do Partido, e em observância da alínea b) do Artº33 dos Estatutos, reuniu-se extraordinariamente o Bureau Político (BP) do PAIGC, com a seguinte ordem dos trabalhos: Análise e avaliação da situação política partidária à luz dos últimos acontecimentos; Diversos. A ordem dos trabalhos foi aprovada por maioria de votos dos presentes. SOBRE A ANÁLISE DA SITUAÇÃO POLITÍCA O Presidente do partido informou ao Bureau Politico que foi completamente inesperado e pelos órgãos de comunicação social que o partido tomou conhecimento de um decreto presidencial que nomeou o Senhor Baciro Djá como Primeiro Ministro da Guiné-Bissau, numa altura em que se aguardava a chegada ao país de uma importante delegação da CEDEAO, seguindo os esforços empreendidos pela mais alta esfera da comunidade internacional, nomeadamente pelo Secretário Geral das Nações Unidas e por outros Chefes de Estado. O Bureau Politico procedeu a uma analise profunda da situação politica vigente no pais, onde se destacou os apelos à coesão, unidade, espirito de reconciliação como condições indispensavéis para preservar o Partido de divisões e fracturas que têm marcado a vivência política nacional. O Bureau Politico criticou de forma veemente o caminho da inconstitucionalidade escolhido para demitir o governo constitucional do PAIGC quando existiam condições objectivas e de interesse nacional para se ultrapassarem as divergências invocadas por via do dialogo, principalmente no aspecto do relacionamento entre o Presidente da Republica e o Primeiro Ministro. O Bureau Politico considerou que o Camarada Baciro Dja ao aceitar a nomeação e investidura no cargo de Primeiro-ministro, a revelia da constituição e dos estatutos do PAIGC, violou o dever do militante plasmado na alínea o do artigo 15º dos Estatutos. O Bureau Politico considerou igualmente que essa atitude do Camarada Baciro Dja põe em causa mais uma vez os superiores interesses do partido, da sua unidade e coesão interna. Diversos No capítulo dos diversos, os membros do Bureau Politico tiveram a oportunidade de prestar alguns esclarecimentos sobre assuntos diversos. Assim, após profunda analise da situação politica vigente no pais, agravada com a recente nomeação do novo Primeiro-ministro a margem das normas constitucionais e internas do PAIGC, O Bureau Politico delibera: Condenar veementemente, a decisão do Senhor Presidente da Republica em nomear através do Decreto Presidencial 6/2015 um novo Primeiro-ministro, a revelia da Constituição da Republica e com total desrespeito pelos Estatutos do PAIGC, partido vencedor com maioria absoluta das ultimas eleições legislativas; Apelar ao restabelecimento da legalidade constitucional por via da anulação do decreto presidencial nº 6/2015 e convite ao PAIGC para, em observância dos seus Estatutos e priorizando a via negocial, encontrar uma solução que assegure a paz, a estabilidade e a unidade nacional; Exortar o Camarada III Vice-presidente a assumir a atitude militante de facilitar o processo de dialogo demitindo-se do cargo para que fora nomeado e empossado inconstitucionalmente e sem o necessário aval prévio do partido, sob pena de infracção grave, conforme plasmado no artigo 103 dos Estatutos: “São consideradas condutas de grave traição politica aos princípios do PAIGC, a violação activa ou passiva directa ou indirecta pelo militante, dos seus deveres estatutários, dispostos nas alíneas j, l, n, o, e p do artº 15 dos Estatutos”; Expressar o seu profundo lamento pelo facto de três moções de confiança ao governo do PAIGC, aprovados por unanimidade e num gesto de elevado patriotismo, pela Assembleia Nacional Popular, não terem merecido nenhuma consideração por parte de Sua Excia. o Presidente da Republica antes da decisão de exoneração do Chefe do Governo e consequente queda do executivo; Instruir as estruturas competentes do partido a accionarem todos os mecanismos legais e políticos com vista a reposição da legalidade constitucional e democrática; Encorajar o Conselho Nacional de Jurisdição a prosseguir a sua acção disciplinar contra todos os que incorram na infracção do artigo 15º alínea o) dos Estatutos do Partido, que reza: E dever de todo o militante do partido ”não apresentar candidatura a qualquer cargo electivo do Estado ou nas Autarquias e não aceitar o exercício de qualquer função governativa, fora do quadro previsto nos presentes estatutos e regulamentos”. Manter em aberto e reforçar os mecanismos de dialogo com Sua Excelência o Senhor Presidente da Republica e com os demais órgãos da soberania, demonstrando o interesse e a disponibilidade do partido em priorizar a via do dialogo construtivo; Expressar todo o seu apreço e enorme satisfação, ao mesmo tempo que encorajar ao reforço das grandes manifestações de solidariedade tanto a nível interno como internacional, em exigência ao respeito do primado da legalidade, como condição de se preservar a paz e a estabilidade no país. Apelar aos militantes, simpatizantes e o povo guineense, em geral a manterem-se atentos e determinados a defenderem as conquistas democraticas e o respeito pela legalidade constitucional. Agradecer o empenho com que a Comunidade Internacional tem seguido os desenvolvimentos da situação politica e enaltecer os esforços continuados do Secretario Geral das Nações Unidas, dos Chefes de Estado da CEDEAO, nomeadamente dos Presidentes do Senegal, da Guiné-Conacry e da Nigéria, e mantê-los informados sobre todas as questões que se prendem com as decisões politicas que vão sendo assumidas pelos diferentes intervenientes políticos e que consubstanciam as bases para preservar os valores consagrados na Constituiçao e demais leis da Guiné-Bissau; Encorajar a Direcção do Partido a prosseguir e alargar os contactos junto dos parceiros internacionais, nomeadamente com a CEDEAO, a CPLP, a UA, a UE e o sistema das nações unidas; Reiterar as deliberações da última sessão do Bureau Politico referentes a retoma do diálogo e a reposição da legalidade democrática e constitucional. O Bureau politico se congratula com a forma serena, mas aberta e franca como os debates se desenrolaram, o que permitiu a cada responsavél defender os seus pontos de vista e no final, colocar os interesses colectivos e do partido em primeiro lugar. Bissau, 22 de Agosto de 2015 O Bureau Politico

Guiné-Bissau: Um Estado virtual

O Conselho de Segurança das Nações Unidas manifestou-se, obviamente, preocupado com a actual crise política na Guiné-Bissau, mais uma de tantas, e pediu aos diferentes órgãos de soberania, claro, o que parece ser quase impossível: o diálogo e o consenso na resolução das suas divergências. Diálogo e consenso são coisas de que normalmente os políticos guineenses se têm mostrado incapazes, desde os tempos em que alguns guerrilheiros preferiram facilitar a vida às autoridades coloniais a terem um diálogo sério com Amílcar Cabral sobre as divergências existências quanto à melhor forma de a Guiné se poder tornar independente. Diálogo foi o que faltou ao relacionamento do primeiro comissário (primeiro-ministro) João Bernardo Vieira, "Nino", com o Presidente Luís Cabral, tendo preferido derrubá-lo e forçá-lo ao exílio. Diálogo foi o que faltou a "Nino", já depois de ter chegado à chefia do Estado, com o primeiro-ministro Victor Saúde Maria, que mandou colocar em prisão domiciliária. Diálogo foi o que faltou ao brigadeiro Ansumane Mané para se procurar entender com "Nino", sem a necessidade de se colocar à frente de uma Junta Militar e de fazer largos meses de guerra a um Presidente que, para tentar sobreviver, pediu a ajuda do Senegal e da República da Guiné. Estes são apenas alguns dos múltiplos exemplos das ocasiões em que os guineenses não souberam dialogar, antes avançando para o achincalhamento, para a traição e para outras práticas muito pouco democráticas. Vem-nos agora dizer o antigo Presidente timorense José Ramos-Horta, que já representou em Bissau o secretário-geral das Nações Unidas, que a crise resulta "de uma Constituição que foi cozinhada em Portugal, sem qualquer consideração à realidade social da Guiné-Bissau, mas encomendada e absorvida na Guiné-Bissau, logo a seguir ao derrube do Presidente Luis Cabral". A partir desse primeiro golpe, o de "Nino" Vieira contra Luís Cabral, a Guiné-Bissau nunca mais conheceu paz. Mas, como o próprio Ramos-Horta foi capaz de reconhecer, esse modelo constitucional não desculpa tudo. Claro que não desculpa, pois que já no tempo da luta armada havia fortes conflitos, com certos combatentes mais interessados numa Guiné que fosse só para negros do que em trabalhar com os comandantes cabo-verdianos que se haviam prestado a estar com eles numa causa comum. O mal é muito antigo e tem algo a ver, conforme já o cheguei a sublinhar, com o facto de não haver muito mais gente alfabetizada, para se poder alargar o leque das escolhas possíveis para a governação do frágil país. A falta de um número maior de quadros e de cidadãos devidamente letrados, que não se deixassem arrastar em aventuras, sejam elas conduzidas por caudilhos militares ou civis, poderá explicar a agitação quase permanente que se vive na Guiné-Bissau, uma terra que devidamente aproveitada até dava para todos viverem de uma forma aceitável. Como o regime colonial não teve o cuidado de alfabetizar 15 ou 20 por cento da população que fosse, e como nas primeiras décadas da independência não se generalizou a alfabetização, que deveria ter sido em massa, chegamos a esta altura da História com um grande défice de cultura cívica. Ainda há muitos guineenses a pensar, em primeiro lugar, como balantas, manjacos ou mandingas, e não como cidadãos de um país novo que importa levar para a frente, recorrendo aos múltiplos recursos naturais de que dispõe, como o petróleo, o ouro, os fosfatos e as bauxites. Só assim se explica, pela ausência de 100 ou 200 bons políticos, credíveis, formados em devido tempo, e não à pressa, que tenhamos na Presidência da República da Guiné-Bissau um senhor que não é capaz de estabelecer consensos com a Assembleia Nacional Popular nem com a direcção dos principais partidos políticos. Quando o Presidente José Mário Vaz demitiu o primeiro-ministro Domingos Simões Pereira e foi chamar para o seu lugar um polémico indivíduo chamado Baciro Djá ficou patente que este deveria ter muita dificuldade em constituir equipa, à margem das pessoas que nos últimos dois ou três anos já têm passado pelo Governo. Apertado, isolado, temendo pela vida, bem poderá José Mário Vaz solicitar ao seu vizinho setentrional, o Senegal, que lhe envie tropas de elite, a protegê-lo a ele e ao seu novo e quiçá efémero primeiro-ministro. Não é assim que se resolvem as situações, alheando-se do sentimento da maioria da população e pedindo a alguns estrangeiros que nos protejam, com a eventual promessa de que também nós iremos proteger os seus interesses, nomeadamente na exploração de recursos nas águas que nos são comuns. Se José Mário Vaz e Baciro Djá só conseguirem ficar nos seus lugares sob a protecção de uns quantos comandos senegaleses, muito mal vai a Guiné-Bissau, uma vez mais. E de nada lhe servirão os muitos apoios que lhe foram prometidos durante a mesa redonda de Bruxelas. Teria sido tudo em vão, tanto o afastamento dos militares golpistas como as eleições do ano passado e a tão elogiada mesa redonda. Tudo fogo fátuo. Num território onde a crise parece ser a forma permanente de vida, só aqui e ali intervalada por uns ténues lampejos de esperança. É esta a triste realidade!

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Meu sangue latino

A playa de Matalascañas foi uma das minhas descobertas do início dos anos 80, pois lá passei um dia e uma noite (na pensão Abelardo). Também conhecida por playa de Castilla, à beira das marismas do Guadalquivir e do Santuário de El Rocio. Ficou-me gravada no coração, tal como Antequera, la plaza de toros de Ronda (a mais antiga de Espanha), Córdoba, Granada, Ceuta...Europa, minha pátria, que tanto amo, cuando estoy de ti lejos...Quisera ser tanta coisa em tanto lado! Ir cortar o cabelo a Almeria, fazer amor em Sevilha, ver nevar em Copenhaga. Um dia subi a um monte, perto de Oslo, e fiquei a olhar a paisagem. Quando conheci Amesterdão senti-me velho. Em Dusseldórfia comi carne de porco. Em Berlim passeei pela floresta, em Grunewald. Saudade. Em Formentera a água estava tão quente que mal me lembro de outra assim. Em Aix-e-Provence tomei café sob os plátanos. Saudade. No Chateau d'IF visitei a cela do abade Faria. Em Buenos Aires, aonde nunca fui, palpita o meu sangue latino. Eis um retrato de mim, Jorge, 1971/1985

terça-feira, 11 de agosto de 2015

E agora, eu?

Se tento comunicar-me, o que há é apenas a noite e uma espantosa solidão. Assim escreveu Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e assim o penso, o sinto, muitas vezes eu. Devo seguir até ao enjoo? Posso, sem armas, revoltar-me? perguntou o poeta mineiro, que um dia chegou a ler uns parcos versos meus, que lhe foram mostrados por um amigo comum, o Eduardo Chianca de Garcia. E com essas perguntas me identifico. Em vão me tento explicar, os muros são surdos. Que poderia ele; e que posso eu fazer? Perdi os melhores amigos. Já não tento qualquer viagem. "Sinto que o tempo sobre mim abate sua mão pesada. (...)Uma aceitação maior de tudo, e o medo de novas descobertas". Se eu pudesse recomeçar os meus dias! Usar de novo a minha adoração pelos deuses que tive. "Vejo tudo impossível e nítido". E depois das memórias vem o tempo trazer novo sortimento de memórias, até que, fatigado, me recuso, como ele, e não saiba já se a vida é ou se de facto foi. E agora, José? E agora, Carlos? E agora, eu? Jorge Heitor 30 de Novembro de 2014

Figo: Jogadas africanas

Foi um encontro casual. Luís Figo ia para Angola e Veríssimo Nancassa, ex-ministro guineense e antigo quadro do Banco Mundial, preparava-se para embarcar para Dacar, no Senegal. Os dois cruzaram-se na zona lounge do aeroporto de Lisboa. “Já nos conhecíamos e cumprimentámo-nos. Em conversa disse-- lhe que estava no sector das minas e ele respondeu que já tinha pensado investir na área. Nasceu assim uma parceria”, recorda à SÁBADO o actual sócio do ex-futebolista, a partir da capital senegalesa. Pouco mais de três anos depois desse encontro, a empresa que Luís Figo criou em 2010, a Damash Minerals, tem duas concessões no Senegal, quatro na Guiné-Conacri e está em negociações com os governos do Burquina Faso, Mauritânia, Mali e Brasil. A entrada de Figo no sector mineiro terá acontecido no fim de 2009. “Na época eu estava a trabalhar com a West Africa Mining Holding e, como ele ficou interessado, convidámo-lo a fazer parte da empresa”,diz Veríssimo Nancassa. A holding alemã, sediada em Zug, na Suíça, controlava e tinha participações em várias empresas com explorações no Senegal e na Guiné-Bissau. Em Março de 2010, a própria companhia anunciou que o ex-futebolista se comprometeu a adquirir 11% da holding através da sua firma, a DamafhSGPS, e que seria eleito para a comissão executiva do grupo. Em Abril desse ano,o futebolista terá chegado a participar no Salão Internacional das Minas, em Dacar, como representante do grupo. No entanto, a compra acabou por não se realizar. “Houve contactos e negociações, mas o negócio nunca se concretizou”, diz à SÁBADO Luís Figo, através do seu advogado. NO ENTANTO, O INTERESSE do futebolista pela área aumentou. “Luís Figo estudou várias possibilidades de negócio que lhe foram surgindo na área de exploração mineral, na componente de minérios e na petrolífera”, explica o advogado. A 29 de Junho de 2010,registou na conservatória do registo comercial de Almada a sociedade Damash Minerals – Exploração Mineira, Lda., com sede na Rua Mário Botas,na Aroeira, dedicada à prospecção, extracção, preparação e exploração de minérios metálicos e à importação,exportação, distribuição e venda dos respectivos produtos. (...) NUNO TIAGO PINTO/Sábado 2012

Fidel faz 89 anos

Todos os homens sonham, mas não sonham de igual modo. E um dos que mais sonhou, neste último século, foi Fidel Castro Ruz, de ascendência galega, oriundo de uma família que vivia no Noroeste da Península Ibérica e que a dada altura emigrou para Cuba, nas Caraíbas. Fidel, que faz agora 89 anos, derrotou o ditador Fulgêncio Batista, enfrentou os Estados Unidos e libertou o povo cubano da subordinação ao grande vizinho norte-americano. O galego, que vive da terra e do mar, a norte do rio Minho, é por natureza um sonhador, um homem que vai muito além do Cabo Finisterra e que leva a sua vivência ao resto do mundo. "Galiza ficas sem homens que possam colher teu pão", escreveu a poetisa Rosalía de Castro, ao falar do grande drama da emigração, que só no ano de 1853 atirou com dois milhões de galegos para as Américas, devido à seca e à crise agrícola, que se fazia sentir naquela parte da Espanha. Foi nessa Galiza devastada que em 4 de Dezembro de 1892 nasceu Angel Castro, pai de Fidel. E dela partiu, aos 20 anos, para ir combater pela Espanha, em Cuba, contra os norte-americanos. Depois, em 13 de Agosto de 1926, às duas da manhã, no meio de um grande ciclone, nasceu Fidel Alejandro Castro Ruz: "Nasci guerrilheiro, porque nasci a meio da noite", contaria ele um dia a Frei Betto, sacerdote brasileiro. Como a mãe não foi a esposa oficial do pai, María Louisa Argota, mas sim uma empregada da casa, Lina Ruz, Fidel desenvolveu desde pequeno um certo sentimento de clandestinidade, que o levaria a lutar contra os poderes instituídos e a procurar forjar uma cultura cubana totalmente nova, de que o mundo inteiro viesse a falar. Filho espiritual de José Martí, herói da independência, Fidel nunca teve verdadeiramente uma fé religiosa, porque toda a sua força foi concentrada na aquisição de uma fé política, inabalável, que faria mover montanhas, até os Estados Unidos compreenderem, de uma vez por todas, que Cuba nunca se iria vergar aos seus intentos. Dias depois de ter entrado na Havana, vencedor, depois dos anos de guerrilha, Fidel tinha uma aura equiparável à de Cristo. Ele era o Messias de um tempo novo, o herói de Sierra Maestra, o chefe que tantos iriam admirar, tanto na América Latina como na África e na Ásia. Muito mais tarde, em Agosto e Setembro de 1975, Fidel enviou para Angola alguns dos mais importantes oficiais das suas Forças Armadas, de modo a que o MPLA não fosse derrotado pela FNLA, pela UNITA ou pela África do Sul. E quando chegou Novembro já não eram só oficiais, mas sim batalhões inteiros. El Comandante assistiu à partida de barcos e barcos carregados de soldados, para que Angola fosse verdadeiramente independente e dirigida por António Agostinho Neto; e não por Holden Roberto ou por Jonas Malheiro Savimbi. Na Primavera de 1977, Fidel Alejandro Castro Ruz fez uma viagem triunfal à Argélia, Líbia, Iémen do Sul, Somália, Etiópia, Tanzânia, Moçambique e Angola. "Os sentimentos irão para além dos estreitos horizontes das fronteiras de um país", disse então "O Príncipe da Guerrilha", como lhe chamou Georgie Anne Geyer, num livro publicado em 1991 em Boston, Toronto e Londres. Hoje em dia ele já não é mais o chefe formal de Cuba, devido à idade avançada; mas continua a reflectir sobre o que se passa pelo mundo fora e a publicar artigos sobre os principais problemas da humanidade. Jorge Heitor 11 de Agosto 2015

terça-feira, 2 de junho de 2015

Costa do Marfim: Em ano de eleições

Pilhado e incendiado na sequência das violentas manifestações anti-francesas de 2004, o maior liceu francês de Abidjan, centro comercial da Costa do Marfim, reabriu oficialmente as suas portas esta semana, depois de 11 anos de encerramento. E a reabilitação custou 11 milhões de euros. O país, que no original se intitula Cote d'Ivoire, manteve fortes laços com a França depois de se ter tornado independente, em 1960. O desenvolvimento da produção do cacau para exportação e o investimento estrangeiro fizeram dele um dos mais prósperos da África Ocidental, mas não o protegeram de alguma agitação política. Em Dezembro de 1999, um golpe militar derrubou o Governo; e o líder da junta que se seguiu, Robert Guei, deturpou as eleições efectuadas em finais de 2000, proclamando-se ilegalmente vencedor. Mas o protesto popular obrigou-o a retirar-se e levaram ao poder o historiador socialista Laurent Gbagbo. Depois, políticos da oposição e militares desencantados tentaram novo golpe em Setembro de 2002, do que resultou uma rebelião e uma guerra civil, que terminou em 2003 com o país partido ao meio: os rebeldes no controlo do Norte e o Governo no Sul, com uma zona tampão entre eles. Em Março de 2007, o Presidente Gbagbo e o antigo líder rebelde das chamadas Forças Novas, Guillaume Soro, assinaram um acordo pelo qual este último passava a ser primeiro-ministro. Mais tarde, nas eleições de Novembro de 2010, o liberal Alassane Dramane Ouattara ganhou, mas Gbagbo não aceitou passar-lhe o testemunho, pelo que tivemos cinco meses de impasse. Até que, em Abril de 2011, depois de muita luta, Gbagbo foi à força afastado do poder por partidários de Ouattara, antigo quadro do Fundo Monetário Internacional (FMI). Milhares de capacetes azuis das Nações Unidas e centenas de soldados franceses ficaram na Costa do Marfim, para garantir que a situação se iria normalizar, de acordo com o desejo do FMI, dos Estados Unidos e de outras instâncias. O triunfo do liberalismo O desejo do liberal Ouattara, muito amigo de Nicolas Sarkozy, é reconstituir as infraestruturas de uma antiga colónia que teve como primeiro Presidente Félix Houphouet-Boigny, aquele que transferiu a capital de Abidjan para a sua terra natal, Yamassoukro, onde ergueu uma catedral à imagem e semelhança da de São Pedro, em Roma. Muitos dos partidários do Professor Laurent Gbagbo refugiaram-se no vizinho Ghana, enquanto ele se encontra na Haia, a aguardar julgamento pelo Tribunal Penal Internacional. As próximas eleições presidenciais vão ser em Outubro, com probabilidade de reeleição de Ouattara, apadrinhado pela grande finança internacional, que o considera um homem providencial e o salvador de um país que andava à deriva, nos tempos do socialista Gbagbo. Ele é um homem do Norte, com laços ancestrais ao Burkina Fasso, que antigamente se chamava Alto Volta. Nasceu em Dimbokro, no centro, em 1942, e aos 20 anos terminou o liceu em Ouagadougou, a capital burkinabe. Depois, com uma bolsa norte-americana, prosseguiu os estudos nos Estados Unidos, tendo-se doutorado em ciências económicas na Universidade da Pensilvânia, em Filadélfia. Seguiu-se a entrada no FMI, em Washington, no ano de 1968. Cinco anos mais tarde, Ouattara foi recrutado para o Banco Central dos Estados da África Ocidental (BCEAO), que tinha então a sede em Paris, antes de em 1978 a haver transferido para 1978. O socialista Gbagbo Quanto ao antigo Presidente Gbagbo, nasceu dia 31 de Maio de 1945 em Gagnoa, numa família católica, e estudou História na Universidade de Abidjan, depois do que passou para a Sorbonne, em Paris, de onde saiu para leccionar na Costa do Marfim, onde se envolveu em actividades políticas que em 1971 o levaram à cadeia. Em 1980 Gbagbo passou a director do Instituto de História, Arte e Archeologia Africana da Universidade de Abidjan, depois do que formou a Frente Popular Marfinense e passou pelo exílio na França, onde contava com toda a simpatia e solidariedade do Partido Socialista. Em Abril de 1990 o histórico Houphouët-Boigny, do qual Alassane Dramane Ouattara chegou a ser primeiro-ministro, reconheceu os partidos da oposição e marcou eleições multipartidárias, que ganhou, mas em 1993 viria a morrer, tendo-lhe sucedido o ministro das Finanças, Henri Konan Bédié, que em 1999 foi deposto pelo golpe do general Robert Gueï. É assim, com uma séria de acidentes de percurso, que tem vindo a decorrer a vida do maior produtor mundial de cacau.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Thomas Sankara vai ser exumado

Promises par les autorités de transition, les opérations d'exhumation des corps supposés de Thomas Sankara et de ses douze camarades assassinés le 15 octobre 1987 débuteront le lundi 25 mai au cimetière Dagnoën de Ouagadougou. Après des années de blocage judiciaire, l'enquête sur l'assassinat du président Thomas Sankara va bientôt connaître un tournant décisif. Lundi 25 mai, trois experts - deux médecins légistes burkinabè et un français, le professeur Alain Miras - débuteront, sur ordre du juge d'instruction militaire François Yaméogo, l'exhumation des corps supposés du capitaine révolutionnaire et de ses douze camarades, au cimetière de Dagnoën, à Ouagadougou. >> Lire aussi Burkina Faso : l'affaire Thomas Sankara, chronique d'un déni de justice Selon Me Benewende Sankara, avocat de la famille de l'ancien chef de l'État, les opérations débuteront à 8h du matin en présence des familles des victimes. La première tombe ouverte sera très probablement celle de Thomas Sankara. Si l'ouverture des sépultures et les prélèvements ADN sur les corps supposés ne devraient prendre que quelques jours, l'analyse des résultats devrait, elle, être moins rapide. Selon une source proche du dossier, "les prélèvements seront sûrement analysés dans des laboratoires étrangers". Depuis la chute de Blaise Compaoré, le 31 octobre dernier, l'espoir de découvrir la vérité sur la mort du président Sankara a refait surface au Burkina Faso. Pour la première fois en près de vingt ans de procédures, un juge d'instruction a été nommé et chargé d'enquêter sur cette affaire d'État. Il a commencé par placer sous scellé, le 9 avril, les treize tombes présumées de Thomas Sankara et de ses camarades, assassinés par un commando d'hommes armés le 15 octobre 1987 au Conseil de l'entente. Il a ensuite entamé les auditions de témoins ou de proches des victimes. Mariam Sankara, la veuve de l'ancien président, a notamment été entendue pendant plus de huit heures le 18 mai, quatre jours après son retour symbolique à Ouagadougou. Lire l'article sur Jeuneafrique.com : Justice | Burkina : l'exhumation du corps supposé de Thomas Sankara débutera le 25 mai à Ouagadougou | Jeuneafrique.com - le premier site d'information et d'actualité sur l'Afrique Follow us: @jeune_afrique on Twitter | jeuneafrique1 on Facebook

Auf wiedersehen, Berlin!

Ao som de música russa, sento-me no sofá grande da sala; e sei que ali em frente alguém dança Hamlet. Tenho calor. Desaperto mais um dos botões da camisa. Tento fazer o mesmo ao cinto e vejo os turbantes dos árabes que porventura entraram agora em cena. O cão de pelo negro, encaracolado, dorme a meus pés. O gato repoisa no sofá ao lado. E a conversa agora é numa das línguas da antiga Jugoslávia. Aperta o calor. Sinto que a refeição me ficou pesada, mas também estou demasiado cheio para ir passear até ao parque. Peço ao cigano mais próximo que toque para mim, enquanto as jovens pioneiras cantam as marchas. Surge no ambiente o som de uma flauta; e com isto se interrompe a cena. Dia e meio depois, um parque, um relvado, à beira de um lago. Um sol esplendoroso. Ruído de helicóptero na paisagem. Árvores verde-escuras da Prússia. O creme de bronzear a derreter-se na cara. O velho, cheio de varizes, que coxeia. O cão que não quer ir até à água. Pachorrentamente deitado junto da bicicleta. Um parto difícil no centro da capital. Um homem que dá corda ao seu realejo. Um bar cheio de fumo. A voz de Sinatra. Um parque nocturno. As sombras que passeiam. Volkspark. Grunewald. Os marcos de um descanso berlinense. O pai que brinca com a filha. O suor que escorre pelo rosto. Os corpos desnudos. As bombas que rebentam. Jugoslavos e turcos trabalham na cidade. Os carros blindados continuam a passar. Intensifica-se o som de um helicóptero. Surgem bandas na avenida. Ladra um cão. É o tempo berlinense. A saudade de uma Prússia perdida. Bitte Schön. Danke Schön. O Tédio. Jorge Máximo Heitor, Agosto de 1973

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Togo, um país infeliz

As eleições presidenciais nada mudaram num território que o explorador Gustav Nachtigal anexou em 1884 em nome do imperador da Alemanha e ao qual deu o nome de Togo, que era apenas o de uma aldeia. O pequeno país continua a ser um dos mais infelizes ao cimo da Terra. Jorge Heitor ________________________________________ O Tribunal Constitucional do Togo confirmou que o Presidente cessante, Faure Essozimna Gnassingbé, conseguiu um terceiro mandato, com 58,77 por cento dos votos expressos, numa eleição realizada dia 25 de Abril, tendo derrotado, entre outros, o líder da oposição, Jean-Pierre Fabré, de 62 anos, que liderava a coligação Combate por uma Alternância Pacífica (CAP 2015). Esta vitória faz com que a mesma família acabe por continuar no poder durante mais de meio século, dado que Gnassingbé é Presidente desde 2005, tendo sucedido a seu pai, Eyadema, que estivera 38 anos na chefia de uma unidade territorial que chegou a fazer parte da colónia modelo do antigo império colonial alemão. O Tribunal Constitucional disse que Fabré obteve 35,19 por cento dos votos, indo o resto para os demais candidatos, que à partida já se sabia que não iriam ter qualquer hipótese: Aimé Tchabouré Gogué (ADDI), Gerry Taama (NET) e Mohamed Tchassona Traoré (MCD) obtiveram 4,03 porcento, 1,03 porcento e 0,90 porcento dos sufrágios, respectivamente De nada serviu Jean-Pierre Fabré ter considerado os resultados fraudulentos; e no Togo não existe qualquer limite legal para o número de mandatos que um Presidente pode ter, de modo que o actual status quo se poderá arrastar ainda durante muito tempo. De pai para filho Faure Gnassingbé é filho de uma senhora do Sul do país, Sabine Mensah, e de um Presidente no Norte, o velho ditador Eyadema Gnassingbé, tendo nascido em 6 de Junho de 1966, predestinado a dar continuidade a uma dinastia que começara em Abril de 1967. Tendo passado pela academia militar de Saint-Cyr e pela Universidade Paris-Dauphine, na França, o homem agora reeleito Presidente do Togo é titular de um Master of Business Administration (MBA) obtido na Universidade George Washington, dos Estados Unidos. Em 1999 foi eleito deputado por um círculo do centro do pequeno país, tendo ido logo parar à presidência da comissão parlamentar de Relações Exteriores e de Cooperação, para em 2003 conseguir ser reeleito deputado o obter o lugar de ministro do Equipamento, das Minas, dos Correios e das Telecomunicações. Era aí que estava quando o pai morreu, em 5 de Fevereiro de 2005; e o Exército colocou-o de imediato no poder, perante grande escândalo da comunidade internacional, que obrigou a que houvesse eleições, que ele naturalmente ganhou, dado o grande peso da máquina partidária do Rassemblement du peuple togolais (RPT), que fora criado em Agosto de 1967, como partido único. No entanto, de modo a que algo mudasse, para que tudo ficasse praticamente igual, o novo Presidente distanciou-se progressivamente do RPT e lançou, em Abril de 2012, a União para a República (Unir), com uma nova geração de ministros e de conselheiros. Foi aquilo a que se costuma chamar a renovação na continuidade; pouco mais do que uma operação de cosmética. 1,2 milhões de votos Faure Gnassingbé conseguiu agora 1,2 milhões de votos, face aos 692.584 do seu principal adversário, que falou de irregularidades havidas durante o escrutínio. Jean-Claude Codjo, da Comissão Nacional de Eleições, chegou a abandonar uma reunião, alegando "falta de transparência" em todo o processo. Mas nada disso impediu que o herdeiro do velho general Eyadema continue em cena por mais cinco anos, pelo menos, no âmbito de um esquema de perpetuação que conhecemos numa série de outros países africanos, como o Chade, os Camarões, Angola ou o Zimbabwe. A afluência às urnas foi de apenas 40 por cento, uma vez que a maioria da população já nem acredita muito na forma como as coisas se processam, numas terras que em Agosto de 1914 foram conquistadas aos alemães por forças franco-britânicas, numa campanha militar de escassas três semanas. Depois da II Guerra Mundial, a parte do Togo que estava a ser administrada pelo Reino Unido juntou-se à Gold Coast, para dar o Ghana, enquanto o território sob tutela francesa se tornou independente em 27 de Abril de 1960. Os primeiros anos de vida da República foram dominados por dois políticos, Sylvanus Olympio e Nicolas Grunitsky, até que em 1967 ela se tornou um feudo da famíla Gnassingbé. O país mais infeliz Num relatório internacional sobre felicidade, recentemente elaborado por um catedrático canadiano, um norte-americano e um britânico, o Togo é considerado o mais infeliz dos 158 países analisados, talvez pela falta de uma verdadeira democraticidade; e até porque, entre uma série de outros factores negativos, não existem empregos suficientes. O Produto Nacional Bruto per capita cifra-se nuns míseros 380 dólares (muito inferior ao do Quénia, de Marrocos, da Nigéria ou da África do Sul). Tendo a norte o Burkina Faso, a ocidente o Ghana e a leste o Benin, o Togo, com os seus escassos 57.000 quilómetros quadrados e a capital em Lomé, tem 6,7 milhões de habitantes (3,5 milhões de eleitores) e um clima tropical, sub-sariano, dependendo essencialmente da agricultura. Tendo em conta que já fez parte de uma colónia alemã e que depois esteve sob tutela de outras potências europeias, ainda não conseguiu desenvolver uma autêntica e sólida unidade nacional, até porque nele vivem perto de 40 grupos étnicos, a começar pelo Ewe, que representa 32 a 40 por cento da população e que domina o Sul. Um pouco mais de metade dos togoleses professam crenças indígenas, 29 por cento são cristãos e 20 por cento muçulmanos, havendo ainda um longo trabalho a fazer para superar todas estas clivagens, tanto as linguísticas como as religiosas. A etnia Kotokoli predomina no Centro e a Kabye (22 por cento da população) no Norte. As línguas do país correspondem às divisões étnicas, sendo a Ewe (ou evhé) a língua veicular no Sul, a parte mais aberta ao exterior; mas o francês tem vindo a ser progressivamente compreendido e falado nos últimos 50 anos. O factor racial Um dos motivos porque Jean-Pierre Fabré não conseguiu chegar a constituir uma alternativa de peso a Gnassingbé é o de ser mestiço, filho de um pai de origem francesa e de uma mãe togolesa, numa África Negra onde muitas vezes a miscigenação não é bem vista. Toda a sua carreira foi feita à sombra do adversário histórico dos Gnassingbé, Gilchrist Olympio, filho do Presidente Sylvanus Olympio, assassinado em Janeiro de 1963, no decurso de um golpe de estado, protagonizado pelo então sargento Etienne Eyadema e que colocou na chefia do Estado Nicolas Grunitsky. Eyadema, que viria a trocar o nome pouco africano de Étienne pelo de Gnassingbé, ficou então na sombra, por quatro anos, até que em 1967, já tenente-coronel, deu novo golpe e ficou ele mesmo como senhor todo poderoso, sem qualquer sombra de dúvida. A vitória acabou por caber, uma vez mais, à política de nacionalismo económico e cultural herdada do RPT, o partido do velho general Eyadema, que com a Nigéria promoveu a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), cuja carta foi assinada em Lomé, por 16 países, no ano de 1976. Foi sob pressão internacional que em 1993 o ditador legalizou os partidos da oposição e convocou eleições formalmente multipartidárias, que arranjou maneira de ganhar, com 96 por cento dos votos oficialmente expressos. Os 55 quilómetros de litoral togolês situam-se integralmente na região que no século XVII foi baptizada como Costa dos Escravos; e, por ironia do destino, os togoleses hoje em dia já não são de forma alguma escravos dos ingleses e holandeses de antanho, mas sim cativos de uma família política que se instalou no poder durante a década de 1960 e que parece não fazer a mínima intenção de o deixar tão depressa. 7 de Maio de 2015

terça-feira, 5 de maio de 2015

Cante Alentejano na Ovibeja

A Ovibeja, grande realização agropecuária e industrial que todos os anos se realiza na cidade portuguesa de Beja, foi desta vez, nos últimos dias de Abril e primeiros dias de Maio, dedicada ao Cante Alentejano, uma forma de música coral recentemente reconhecida como Património Cultural Imaterial da Humanidade. Um dos pavilhões da enorme feira, que atraiu muitos milhares de visitantes, foi especialmente dedicado à apresentação daquele género musical, que a par do Fado é um dos que mais se destacam em Portugal e marcam a identidade cultural do país. Fora de Beja, também Cuba, Serpa, Moura e outras localidades da região ostentaram nas fachadas dos seus edifícios públicos faixas de homenagem a uma expressão artística que tão bem traduz a alma do Alentejo, território vasto dominado pelas plantações de sobreiros, de onde se extrai a cortiça. Em cada Cante, em cada palavra cantada, o povo alentejano lembra o muito que tem sofrido ao longo dos tempos, mormente no tempo em que as suas terras se encontravam sobretudo na posse de grandes latifundiários, auferindo os trabalhadores, ou ganhões, salários que se poderiam considerar de miséria. Era assim há 45 ou 50 anos, antes do 25 de Abril de 1974 e da Reforma Agrária, que muito vieram modificar a forma de vida em todo o Alto e Baixo Alentejo, que se situam sensivelmente num espaço que vai de 70 a 250 quilómetros a partir de Lisboa, para Sul e Sueste. Hoje em dia, para além do tradicional sobreiro, o Alentejo também é muito conhecido pelas suas vinhas, das quais se extrai um vinho delicioso, cada vez com mais clientes. E não deixa de ter praias bem conhecidas, como Porto Covo, Vila Nova de Milfontes ou Zambujeira do Mar. O Cante é pois um grande hino a uma terra em evolução, terra onde os naturais deixaram de ser explorados como tantas vezes acontecia, tanto nos campos como nas minas. Hoje em dia há mais justiça, as pessoas sentem-se melhor, em municípios como Évora, Beja, Cuba, Serpa, Moura, Alvito ou Vidigueira. E por isso sabe sempre bem visitar ou passar alguns dias no Alentejo, uma vastidão tranquila, de grande sossego. JH 5 de Maio de 2015

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Basta de xenofobia sul-africana!

Confesso que nunca gostei da África do Sul, nem antes, nem depois do apartheid. Tenho muitos familiares que por lá passaram, tenho sobrinhos que lá trabalham, mas nunca tive aquele país como lugar ideal para passear ou estar. Coisa pessoal e sem explicação plausível. Só para ter uma ideia: como homem entrei naquele território menos de cinco vezes. Naturalmente passo de viagem pelo Aeroporto de Joanesburgo, mas não considero isso ir à África do Sul. Detesto o país e o carácter violento dos sul-africanos. Fui criado num ambiente eminentemente religioso, anglicano, onde tudo o que é violência é proibido, é coisa do Satanás. Na minha adolescência briguei com dois jovens da minha idade a ponto de chegarmos a vias de facto, sendo que fomos obrigados a uma reconciliação que, na minha tradição, passa por beber água do mesmo copo, de pau com um carvão a brasa. Até hoje não consigo explicar, mas é assim como as “grandes” brigas terminam ou terminavam na minha terra. Com os dois continuámos amigos até que cada um seguiu o seu rumo. Aquilo que está a acontecer com os nossos concidadãos na África do Sul não só não é admissível como é condenável a todos os títulos. Não é preciso recordar aos sul-africanos o papel de Moçambique para a libertação daquele país do sistema do apartheid. Ainda que não tivéssemos jogado nenhum papel, existe o princípio de convivência entre pessoas, entre humanos, independentemente das diferenças entre as pessoas. Perseguir, violentar, matar e decepar partes do corpo de uma pessoa e exibir são coisas que devem colocar o governo da África do Sul no tribunal dos direitos humanos. Basta de boas relações políticas que só servem para as elites políticas, quando os povos desses países estão desavindos. Discordo com a forma “mansa” como o nosso Governo lida com este dossier. É preciso responsabilizar os sul-africanos e o respectivo Governo. É preciso avançar-se para a acção de boicote a vários níveis, incluindo impedí-los de cá virem. É verdade que ganhamos com o turismo, mas se a nossa terra é espaço preferencial para o turismo, outros utilizadores cá virão. Outros compreenderão as nossas razões e nos apoiarão, porque, acima de tudo, estão em causa os direitos humanos mais elementares, o direito à vida. As diferentes organizações da sociedade civil e contrariando o Governo devem denunciar estes Reflexão (245) de: Adelino Buque Basta de xenofobia sul-africana! assassinatos bárbaros e hediondos. Devemos todos colocar os sul-africanos no seu devido lugar. Os investimentos da África do Sul não crescem em Moçambique porque somos simpáticos, isso sucede porque ganham fabulosos lucros com os negócios. É preciso que se sintam afectados através do boicote total aos produtos e bens daquele país. Temos muitas alternativas, mas, também, com o que está a acontecer, as instituições governamentais devem reflectir sobre o que fazer para que cresçam postos de trabalho em Moçambique e boa parte dos cidadãos fique a trabalhar no país e se ache livre desses sanguinários. Definitivamente, devemos condenar os actos xenófobos com toda a energia que temos, devemos lutar por levar os sul-africanos e respectivo Governo à barra do Tribunal e, se calhar, isolar nas relações com outras sociedades do mundo. Na verdade, diz o velho ditado africano que cada um chora a sua mãe, mas na África do Sul não são somente os moçambicanos que estão a ser vítimas de xenofobia. São todos aqueles que não são nativos e que vivem nos subúrbios que, aos olhos dos nativos, roubam-lhes espaços de prosperarem, como se para prosperar bastasse ser nativo e não pelo trabalho. Estes cidadãos nunca foram preferência das grandes companhias mineiras para trabalharem porque são preguiçosos. A ida dos moçambicanos, mesmo no tempo do apartheid, não era por mera simpatia, era para colmatar o deficit de mão-de-obra que as mineradoras precisavam para o trabalho, por isso esses cidadãos que os alojamos e por eles sofremos bombardeamentos do apartheid são esses ingratos que hoje nos decepam cabeças, retiram-nos intestinos, matam-nos e pilham parcos recursos que ganhamos. Basta de XENOFOBIA! Adelino Buque, Correio da Manhã, Maputo

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Que faremos nós com a Líbia?

Infelizmente, poderá ter de haver ainda recurso à força, por parte da comunidade internacional, para se tentar preservar a unidade da Líbia, onde é essencial um acordo entre liberais seculares e fundamentalistas islâmicos, de modo a controlar as milícias armadas que têm agendas múltiplas e aterradoras. Jorge Heitor O Vaticano disse que a força poderá ser necessária para acabar com os ataques aos cristãos e a outras minorias que vivem na Líbia e que estão a ser vítimas do Estado Islâmico (EI), essa nebulosa entidade que a partir do Iraque e da Síria começou a lançar tentáculos até às fronteiras da Tunísia. O arcebispo Silvano Tomasi, principal diplomata da Santa Sé acreditado junto das instituições da ONU com sede em Genebra, na Suíça, afirmou que a força poderá mesmo ser necessária para fazer frente aos jihadistas que estão a cometer um autêntico genocídio e que têm de ser detidos antes de eventualmente entrar em território tunisino e argelino. O Vaticano opõe-se normalmente a intervenções militares no Norte de África, mas agora as coisas chegaram a um ponto tal que tudo está em causa, incluindo a produção petrolífera, que fazia com que a Líbia tivesse um Produto Nacional Bruto per capita superior ao do Líbano, de Marrocos ou da Nigéria. O Papa Francisco e com ele toda a Igreja Católica ficaram chocados com o facto de, em Fevereiro, o EI se ter atrevido a decapitar 21 cristãos coptas do Egipto que estavam a viver na Líbia, essa entidade tão periclitante desde que, há quatro anos, foi derrubado o coronel Muammar Khadafi. O fundamentalismo islâmico Num mundo em que a África do Norte e o Médio Oriente são maioritariamente muçulmanos, face ao cristianismo vigente na África Austral, na Europa e nas Américas, os radicais islâmicos decidiram perseguir os grupos religiosos minoritários que vivem no Iraque, na Síria e na Líbia, tendo obrigado milhares de pessoas a deixar as suas casas. Numa entrevista dada ao site católico norte-americano Crux, monsenhor Silvano Tomasi afirma que o que se torna nesta altura necessário é uma coligação coordenada e muito bem pensada, para fazer tudo o que for possível para se encontrar uma solução para o caso líbio. Se nada se conseguir sem violência, então terá mesmo de se recorrer ao uso da força, de modo a que o terror não alastre, afectando inclusive a Tunísia, a Argélia e Marrocos. O que se pretende é preservar os direitos das minorias, sejam elas cristãs, yazidis, xiitas, sunitas ou alauitas; e para isso terá de haver uma grande coligação, em que tanto estejam americanos como europeus e países muçulmanos do Médio Oriente, como a Arábia Saudita e a Jordânia. Execuções sumárias As execuções sumárias, as conversões forçadas, as violações e outros abusos a que estão sujeitas as minorias poderão tornar-se uma triste realidade quase quotidiana no Iraque, na Síria, na Líbia e outros países, se a Humanidade não acordar a tempo para o que se está a passar. O artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, garante a cada um a liberdade de religião, mas a verdade é que temos vindo a assistir a fortes restricções, no Irão, no Iraque, na Síria, na Rússia, na China, na Birmânia, na Indonésia, no Sudão e em outros países. Os muçulmanos representam 23 por cento da população mundial; e o que nós queremos é que a maioria deles não seja injustamente identificada com as suas franjas mais radicais, como a Al Qaeda e o Estado Islâmico, este último proclamado em 29 de Junho de 2014 por Abu Bakr al-Bagdadi. Os comandos e ramos regionais daquelas duas entidades fazem-se hoje em dia sentir no Mali, no Níger, na Argélia, na Nigéria, na Tunísia, na Líbia, no Egipto, na Somália, no Iémen, na Síria, no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão, bem como no Cáucaso e no Uzbequistão. Um autêntico caos Em Sirta, no litoral líbio, 450 quilómetros a leste de Tripoli, a capital, têm-se verificado inclusive combates entre jihadistas do EI e milícias da coligação Fajr Libya, num xadrez bem difícil de entender e em que todos parecem estar contra todos, só procurando levar a água ao seu moinho, sem qualquer preocupação com a unidade nacional. Existem essencialmente duas autoridades na disputa do poder: um Parlamento e um Governo no Leste do país, a Cirenaica, e um Parlamento e um Governo paralelos mantidos em Tripoli pela Fajr Libya, que em Agosto de 2014 tomou conta da capital e de uma grande parte da região ocidental, a Tripolitânia. Ou seja, a maior parte do país encontra-se sob o controlo de milícias islamitas e só uma pequena parte é que é controlada pelo Governo instalado em Tobruk; o tal que é reconhecido por uma grande parte da comunidade internacional mas que pouco peso efectivo tem. As duas administrações rivais, a de Trípoli e a de Tobruk, tentam combater a influência do Estado Islâmico, o mesmo que se encontra implantado em vastas regiões da Síria e do Iraque e que de igual modo deseja dar cartas no Egipto e na Líbia, para ficar a ser a potência dominante desde as fronteiras do Irão até às da Argélia e da Tunísia. De Noufliyeh a Derna Noufliyeh, 120 quilómetros a leste de Sirta, é um feudo do EI, que de igual modo se encontra presente em Derna, 730 quilómetros mais a leste. Enquanto isto, a ocidente de Tripoli, as forças pró-governamentais do general Khalifa Haftar, cujo peso está em crescendo, efectuam raides aéreos na região de Zouara, depois de a Fajr Libya ter atacado o aeroporto de Zentan, 160 quilómetros a sudoeste da capital oficial do país. Todas estas coisas acontecem numa altura em que, desde meados de 2014 até Março deste ano de 2015, mais de 25.000 combatentes estrangeiros, de 100 nacionalidades, aderiram a grupos extremistas tais como a Al-Qaeda e o EI, conforme se explica num relatório das Nações Unidas enviado há pouco ao Conselho de Segurança. O número de jihadistas estrangeiros que afluíram em cerca de nove meses às grandes zonas de conflito aumentou 71 por cento, de modo que o problema é hoje em dia muito mais grave do que o seria em Abril ou Maio do ano passado. Universidades do terror A Síria e o Iraque são, claro, os maiores destinos dos jovens fanáticos, tendo-se transformado nas escolas superiores do terror que durante os próximos meses e anos nos irá atormentar. Mas depois, se por acaso for possível o EI ser derrotado naqueles dois países, os jihadistas que de lá saírem poderão espalhar-se por todo o mundo, desde a África Oriental ao Magrebe. Há já largas centenas de combatentes extremistas na Líbia, no Iémen, no Paquistão e na Somália, oriundos de países tais como a Tunísia, Marrocos, a França, a Rússia e a Finlândia. O Conselho de Segurança das Nações Unidas tinha pedido o ano passado a alguns peritos que investigassem a ameaça que é constituída pelos combatentes estrangeiros que iam aderindo ao EI e aos demais grupos militantes, como a Ansar al-Charia, os Signatários pelo Sangue, os Soldados do Califado, o Boko Haram, o Ansar Bait al-Maqdis e o Al-Chabab. No fim de Março último ficou pronto o assustador relatório desses especialistas, segundo os quais o fluxo de combatentes estrangeiros às áreas onde prolifera o radicalismo islamita cresceu de alguns milhares há uma década para um nível nunca dantes alcançado. Ou seja, o derrube de ditadores como Saddam Hussein e Muammar Khadafi em nada contribuiu para melhorar o panorama geral nas terras compreendidas entre o Mediterrâneo e o Paquistão, tal como as ditas Primaveras Árabes, nas quais se depositou tanta esperança, em pouco melhoraram, até agora, o quotidiano de líbios, egípcios, sírios, iraquianos ou iemenitas. (Este artigo vai sair em Maio na revista comboniana Além-Mar)

terça-feira, 17 de março de 2015

Da Lili da Parede às bolanhas da Guiné-Bissau

"Recordo-me da menina mais espampanante, na altura areia de mais para qualquer camioneta, a Lili da Parede, uma louraça bem bronzeada, que andava um ou dois anos mais adiantada (creio que frequentava 0 6º, quando nós andávamos no 4º ou 5º)e que hoje dá pelo nome de Lili Caneças". Quem assim escreve é o embaixador Francisco Manuel Guimarães Henriques da Silva, no livro "Guerra na Bolanha", hoje lançado pela editora Âncora, no seu programa sobre o fim do império colonial português. O diplomata nasceu em 17 de Dezembro de 1944, em Lisboa. E Maria Alice Custódio de Carvalho Monteiro, a Lili da Parede, em 4 de Abril desse mesmo ano, na Guarda. "Recordo-me das lições do falecido professor Marcello Caetano. O mestre subia à tribuna, ladeado por dois assistentes, Diogo Freitas do Amaral e Miguel Galvão Teles. Os 300 e tal alunos levantavam-se". Estas são mais algumas linhas das memórias do embaixador Francisco Henriques da Silva, que nos fala dos anos da sua formação, da ida para a Guiné como alferes miliciano e do ingresso na carreira diplomática, que o levaria aos Estados Unidos, à França, ao Canadá, a Bissau, à Costa do Marfim, à Índia, ao México e à Hungria. Manuel Barão da Cunha, coordenador do Programa Fim do Império, escreveu uma nota prévia ao livro de 302 páginas hoje lançado e Mário Beja Santos redigiu o prefácio, no qual chama a atenção para as dificuldades que se poderiam sentir no regresso a casa, depois de dois anos de comissão de serviço no Ultramar. Numa linguagem excepcionalmente fluente, ao alcance de qualquer um, Francisco Henriques da Silva conta-nos o seu nascimento na Avenida Rovisco Paes, junto ao Instituto Superior Técnico, a breve passagem pelo Bairro Azul, a ida para o Restelo, as sessões de cinema no São Jorge e outras salas, o nível da Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro, do Teatro Experimental de Cascais e do Teatro Estúdio de Lisboa, de Luzia Maria Martins e Helena Félix; e fala-nos de tantas, tantas outras coisas, particularmente queridas a quem hoje anda na casa dos 67/70 anos. Vitorino Nemésio, António Lopes Ribeiro, João Villaret e Pedro Homem de Mello não poderiam deixar de ser evocados, quando se está a contar o como era Portugal na década de 1960, quando ele passou por Mafra, Castelo Branco, Tancos e Amadora, antes de ter viajado para Bissau no navio "Uíge". No Depósito de Adidos, em Brá, Francisco Henriques da Silva teve a oportunidade de ouvir logo a seguir à chegada o então governador e comandante-chefe das tropas destacadas na Guiné, António de Spínola, "de monóculo, pingalim e luvas, acompanhado pelo seu habitual séquito". Naquela altura, conta o autor do livro, que tem 302 páginas, António Sebastião Ribeiro de Spínola "encarnava, ou julgava encarnar, tudo: os Lusíadas, a bandeira verde-rubra, Afonso e Mouzinho de Albuquerque combinados, Aljubarrota e os conjurados de 1640...". Era, realmente, um grande sonhador, esse oficial general que durante meia dúzia de anos tudo fez para chegar à chefia do Estado, lugar no qual só se aguentaria por alguns meses. Pobre Napoleão tresloucado, que em 11 de Março de 1975 ainda tentou reconquistar Belém. De todas estas coisas e de muitas, muitas mais, nos fala o embaixador Francisco Henriques da Silva, que inclusive relata conversas com o sogro, António Rosa Casaco, inspector da PIDE/DGS, que foi correio diplomático entre Salazar e Franco, durante a Guerra Civil de Espanha e a Segunda Guerra Mundial. "Não me posso, nem me devo queixar da vida, à parte os pequenos percalços do quotidiano, que, obviamente, também os houve", conclui o autor de "Guerra na Bolanha", pessoa que em Setembro de 2012 já nos dera as "Crónicas dos (Desfeitos) da Guiné", nas Edições Almedina. JH 17 de Março de 2015

terça-feira, 3 de março de 2015

Boko Haram é dominado pela etnia Kanuri

A rebelião do Boko Haram, na Nigéria, e a sua repressão já deixaram mais de 13 mil mortos e um milhão e meio de desalojados desde 2009. Neste contexto, as eleições presidenciais e legislativas, que eram para ter sido em Fevereiro, foram adiadas por seis semanas, para o fim de Março. E o problema, bastante complexo, poderá não se ficar por aqui. Jorge Heitor O líder do Boko Haram, Abubakar Shekau, ameaçou impedir a concretização das eleições gerais previstas para dia 28 de Março na Nigéria. E fê-lo no primeiro vídeo divulgado por aquele grupo fundamentalista na rede Twitter, numa altura em que se está a verificar uma nítida mudança de táctica da organização no que diz respeito às suas comunicações com o resto do mundo, uma vez que elas se estão a tornar muito mais sofisticadas. Tivesse ou não havido essa ameaça explícita, os peritos em assuntos da região já calculavam que poderia muito bem ser impossível votar numa parte do Nordeste da Nigéria, onde se centra a actividade do grupo de Shekau, entretanto também alargada aos Camarões, ao Chade e ao Níger. As eleições já tinham sido adiadas seis semanas, de 14 de Fevereiro para 28 de Março, tanto devido aos ataques do Boko Haram como a dificuldades logísticas; e ficou no ar a hipótese de nem tudo ficar devidamente esclarecido antes de Abril. Se em algumas zonas do país não tiver sido possível votar no fim de Março, terá de se ir para uma segunda volta, algumas semanas depois, continuando assim em suspenso a grande e volúvel federação que é a Nigéria. Insegurança generalizada A violência destes últimos meses tem sido sobretudo no Nordeste do país, mas também no Sul, anteriormente relativamente poupado pela instabilidade, que está a ganhar uma dimensão regional, tocando de igual modo os Camarões, o Chade e o Níger. Desde as alturas do Maciço de Air, no Sara, até às fronteiras do Sudão e do Sudão do Sul, nada é agora seguro, numa África que teima em viver permanentemente agitada, muito longe dos dias relativamente calmos que vamos tendo em Portugal, na Espanha ou na França. Na estrada de Maiduguri, no Nordeste da Nigéria, violentos combates têm colocado frente a frente o Exército do Chade e combatentes do Boko Haram, que poderão totalizar 6.000, segundo cálculo dos serviços secretos norte-americanos. Os Camarões, o Níger e o Chade colocaram as suas tropas ao serviço da Nigéria, procurando mobilizar um corpo de 8.700 homens contra o grupo terrorista Boko Haram, cujo comportamento tanto se assemelha o do Estado Islâmico do Iraque e do Levante. São como que as duas faces de uma mesma moeda: o fundamentalismo islâmico, que tanto se pode revelar no Mali como nas margens do Lago Chade e nas bacias do Tigre e do Eufrates. Um perigo subestimado O Presidente nigeriano, Goodluck Jonathan, reconheceu em Fevereiro ter subestimado a capacidade do Boko Haram, apesar de o escritor Wole Soyinka já ter considerado há muito que o que se passa com o Boko Haram é muito mais grave do que aquilo que aconteceu durante a guerra do Biafra, travada no Sueste da Nigéria entre 1967 e 1970. Nos últimos seis anos, as forças armadas nigerianas têm sido incapazes de travar a expansão do fundamentalismo islâmico, pelo que foi agora necessário o Exército do Chade assumir o comando da luta regional contra tal perigo, que aliás já se fazia sentir a algumas dezenas de quilómetros da capital chadiana, N'Djamena. Por ter andado muito distraído, Goodluck Jonathan poderá agora não ter qualquer hipótese de ser reeleito, face ao desafio constituído pelo candidato Muhammadu Buhari, antigo chefe de Estado, num dos períodos em que os militares estiveram no poder. Teme-se bastante uma espécie de repetição da crise de 1993, quando foi detido o candidato Moshood Abiola e subiu ao poder o general Sani Abacha, pelo que todo o mês de Abril vai ser de uma tensão constante, prejudicando bastante as aspirações da Nigéria a ter um lugar permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. A maior economia africana Há quem lhe queira chamar a maior economia africana, mas a verdade é que o Produto Nacional Bruto da Nigéria não ultrapassa os 3.280 dólares per capita, bem inferior ao da África do Sul. E a construção e os serviços, mais do que o petróleo, é que poderão ajudar agora os 184 milhões de nigerianos, divididos de um modo geral entre uma parte setentrional muçulmana e uma metade meridional cristã. A necessidade de levar até ao fim as eleições, num clima razoável, e o imperativo de controlar de forma eficaz o Boko Haram andam de mãos dadas, para que daqui a alguns meses já se possa circular com alguma segurança por terras como Sokoto, Kano, Zaira, Maidougari, Jos e Bauchi. A estabilização da Nigéria, bem como a do Mali, do Níger e do Chade, é essencial para que milhares e milhares de homens desesperados não se metam a atravessar o Sara, rumo ao Mediterrâneo, tantas vezes para ir morrer à vista de Lampedusa, de Malta ou da Sicília. A corrupção e as deserções têm de acabar, se a federação nigeriana realmente pretender acabar com o Boko Haram e passar a uma nova fase da sua existência, sempre tão periclitante desde a obtenção da independência, em 1960. Uma desgraça de militares Longe de contribuírem para a resolução dos problemas federais, as Forças Armadas da Nigéria têm contribuído muitas vezes para o sofrimento geral, impedindo o conjunto de se afirmar claramente como um dos grandes países do mundo; e uma autêntica potência regional, capaz de dar cartas na Serra Leoa, na Libéria, na Costa do Marfim, no Gana, no Burkina Faso, no Togo e no Benin. Apesar de serem constituídas por 80.000 homens, com dezenas de aviões de combate e oficiais altamente qualificados, as tropas nigerianas têm-se coberto de vergonha ao serem incapazes de neutralizar o Boko Haram, que as deixou pelas ruas da amargura. Um total de 11.000 vítimas em seis anos, 4.000 das quais só em 2014, são o resultado da incapacidade do Presidente da República, do Governo e dos militares para travar o passo aos fundamentalistas islâmicos, que parecem imparáveis. Antes, as Forças Armadas ainda eram coordenadas, rigorosas profissionais, mas agora, como explica o investigador Samuel Nguembock, já não se apresentam como um corpo unificado. O Presidente da República não controla o Estado-Maior General e este não controla as unidades que estão no terreno, diz outro especialista, Marc-Antoine Pérouse de Montclos. Toda a cadeia de comando se tem estado a desmoronar. O factor Kanuri Um dos aspectos de que pouco se tem falado, ao abordar o movimento jihadista e salafita que atormenta o Nordeste da Nigéria, é o de ele ser essencialmente constituído por elementos de etnia Kanuri e grupos a ela associados. O Boko Haram é dominado por um grupo étnico que representa apenas cerca de oito por cento de toda a população muçulmana nigeriana. Não é propriamente uma rebelião tribal, no sentido clássico da expressão, mas teve as suas raízes, no início deste século, sob a direcção de Mohammed Yusuf, na cidade de Maiduguri, de maioria Kanuri, capital do estado de Borno, e contou até com o apoio do então governador estadual, Ali Modu Sheriff, que se manteve no cargo até 2011. Actualmente, para além de se tratar de um movimento que defende uma alegada pureza de certos princípios islâmicos, o Boko Haram também tende a reconstituir as estruturas políticas que existiam na região antes da colonização britânica, no tempo dos impérios de Bornu (1380-1893) e de Karem (ainda mais antigo). Por isso mesmo é que as actividades deste movimento jihadista não se restringem ao Nordeste da Nigéria, antes penetrando em territórios do Níger, do Chade e dos Camarões que outrora, durante muito mais de 500 anos, fizeram parte do conjunto político Bornu-Karem. Certos militares nigerianos, imbuídos de sonhos do passado, de memórias míticas de uma grandeza antiga, chegam a informar o Boko Haram dos movimentos determinados pela oficialidade. E até lhe vendem armas, mormente nos casos em que são privados de pré, ou salário, por comandantes pouco escrupulosos, que na guerra só vêm uma forma de enriquecimento. É toda esta complexidade de problemas, com o peso esmagador da História a influir na actualidade, que temos de ter em conta quando nos debruçamos sobre o que é que está a acontecer na Nigéria, um país relativamente recente, sobre o qual ainda pairam muitas sombras do passado. Só se o fizermos, no âmbito de uma reflexão geopolítica, é que poderemos começar a pensar no que irá acontecer depois da ida às urnas: será o Boko Haram devidamente controlado ou a falta de segurança ainda se agravará, com fortes implicações para todo o enorme país e para a região na qual ele se insere? (este artigo vai sair em Abril na revista missionária comboniana Além-Mar, por encomenda da qual foi escrito)

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Nós não somos Hollywood

"Aquilo não tem nada a ver connosco!", reconhecia ontem, fascinado, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, ao falar na TVI sobre a entrega dos Óscares do cinema norte-americano e ao manifestar o desejo de um dia assistir em directo a essa cerimónia. Claro que não tem nada a ver connosco. E se não tem nada a ver não se justifica ir lá nem assistir pela televisão. É um mundo de fantasia, fechado em si mesmo, nos valores da América do Norte. Aquelas pessoas que ali se juntam, desfilando pela tão falada passadeira vermelha, estão-se nas tintas para as dificuldades da Grécia, para a guerra na Ucrânia, para a dilacerada Líbia, para a guerra civil na Síria, para o Estado Islâmico do Iraque e do Levante, para o Boko Haram, para as desastrosas chuvas de monção em terras asiáticas. Se eles só vivem para os seus vestidos, as suas luvas, as suas jóias, os seus smokings, nós não temos nada a ver com eles. Nós temos é que nos preocupar com uma Europa mais bem governada, mais equitativa, com a pacificação da Ucrânia, da Líbia e da Síria, não é com as festas que se fazem em Los Angeles, na Califórnia, do outro lado do Atlântico e da própria América do Norte. Basta de colonização mental, como aquela que sofremos há 60 ou 70 anos, subordinados aos valores de uma nação que se constituiu chacinando as nações ameríndias. "Aquilo não tem nada a ver connosco", os que aqui, na Europa, procuramos levar uma vida digna, com reformas justas, com menos desemprego. Portanto, não temos de passar horas e horas, na rádio e na televisão, a falar dos malditos Óscares, que são deles, os norte-americanos, os opressores dos apaches, sioux e outros ameríndios. Basta de viver subordinado aos valores dos Estados Unidos da América. JH 23 de Fevereiro de 2015

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Festival da Canção 2015

A RTP acaba de anunciar, em conferência de imprensa, os nomes dos compositores, autores e artistas participantes no Festival da Canção 2015, bem como os títulos das canções. Título: À espera das canções Intérprete: Simone de Oliveira Música: Renato Júnior Letra: Tiago Torres da Silva Título: A noite inteira Intérprete: Filipa Baptista Música: Augusto Madureira Letra: Augusto Madureira Título: Outra Vez Primavera Intérprete: Yola Dinis Música: Nuno Feist Letra: Nuno Marques da Silva Título: Dança Joana Intérprete: Filipe Gonçalves Música: Héber Marques Letra: Héber Marques Título: Um Fado em Viena Intérprete: Teresa Radamanto Música: Fernando Abrantes Letra: Jorge Mangorrinha Título: Quando a lua voltar a passar Intérprete: Rubi Machado Música: Sebastião Antunes Letra: Sebastião Antunes Título: Há um mar que nos separa Intérprete: Leonor Andrade Música: Miguel Gameiro Letra: Miguel Gameiro Título: Maldito Tempo Intérprete: Diana Piedade Música: Carlos Massa Letra: Carlos Massa Título: Mal menor (Ninguém me guia à razão) Intérprete: José Freitas Música: Chukry (Diogo Rodrigues) Letra: Chukry (Diogo Rodrigues) Título: Paz Intérprete: Adelaide Ferreira Música: Adelaide Ferreira Letra: Adelaide Ferreira Título: Tu tens uma mágica Intérprete: Gonçalo Tavares Música: Gonçalo Tavares Letra: Gonçalo Tavares & José Cid Título:Lisboa, Lisboa Intérprete: Rita Seidi Música: Sara Tavares Letra: Sara Tavares & Kalaf

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Novo romance de Harper Lee

So now what, HarperCollins? You surely believed that Harper Lee fans would be overjoyed when you announced this week you would publish the reclusive writer’s long-forgotten first novel, Go Set a Watchman, in July 2015. And some were, surely! But others were worried: Worried about whether Lee really wanted to release this book. Worried about a lawyer who, some neighbors think, is not treating Lee’s work the way she ought to. Worried about an interview with Lee’s editor Hugh Van Dusen, who appeared not to know where the book had come from or whether it had been, or would be, edited. By Katy Waldman, Slate’s words correspondent. In response to these concerns, HarperCollins, you issued a second press release: “I’m alive and kicking and happy as hell with the reactions of [sic] Watchman,” Lee (no quadro)is said to have said. This second press release feels no more reassuring than the first—neither in the fact that, like the first, it conveyed Lee’s words via her lawyer, Tonja Carter, nor that those words were grammatically incorrect. At this point, the circumstances around the release of this novel are so sketchy, the rollout so tinny with false coincidence, that what HarperCollins needs to do is clear: Withdraw Watchman. Don’t publish the book at all.
“Increasingly blind and deaf,” according to many, Lee suffered a stroke in 2007 that forced her to move to an assisted living facility. Several months later, she sued her agent for stealing royalties from To Kill a Mockingbird, and, in 2011, declared that the biographer Marja Mills had penned an “unauthorized” book about her. (Mills insists she had Lee’s blessing and cooperation.) Lee’s protective older sister Alice died last year at the age of 103. And now, 60 years after stashing it in a box and stowing it away, the notoriously shy author decides to send an apparently unedited novel into the world? On Wednesday, Connor Sheets reported in AL.com that multiple Monroeville acquaintances of Lee’s “believe her wishes for her career are not being respected.” Continues Sheets: “Tonja Carter has long represented Lee and has power of attorney over her affairs. But area residents who know the writer say that Carter has in recent years taken steps to keep her from seeing her friends and family, and become increasingly litigious on her behalf in a way that they do not believe Lee would have supported when she was younger and more alert.” One woman Sheets spoke to, Janet Sawyer, described Carter as “greedy,” a predatory presence who “isolated [Lee] from the world in order to manipulate her.” When I emailed a HarperCollins publicist to ask if anyone at the publishing house had ever spoken to Lee directly about the new book, in person or over the telephone, she said no. When I asked her if HarperCollins had any concerns that the release of the book did not reflect Lee’s wishes, especially in light of the accusations against Carter, she said no. When I asked her how she was so certain, she did not reply. Lee’s entire life testifies to how much she does not want this attention, and especially not from this novel: She’s stuck to the shadows. She sat on the manuscript for 60 years. And at this point, the only way HarperCollins can convince us otherwise is to commit a grave offense against Lee’s reticent soul, by dragging her into the spotlight so that she can express her views directly. That is not something an aging and crowd-shy hero of American letters should have to endure. Put another way: Lee’s handlers have placed her fans in a morally compromised position no matter what. If the novel comes out with no clear and compelling indication that Lee wanted it published, buying it is wrong. That’s because decades of evidence suggest that Lee, in sound mind, would prefer to keep the manuscript in a box. (And if that surmise is incorrect, our reasonable doubts—created, primarily, by the curious way the publisher has conducted this announcement—will mean Watchman doesn’t get the pure reception it deserves.) Yet if the novel comes out with direct and public reassurance from Lee that she wants to share it with the world, what a shame. How costly such a gesture would be to this intensely private woman in the twilight of her life. The only way Lee’s publisher can convince us that Lee wants Watchman unveiled, that is, is to force her to violate her own long-held principles and mutilate her carefully tended seclusion. With another author, one whose whole life wasn’t an argument against publicity, self-promotion, the careless release of half-baked writing, we might be willing to take a publisher’s word for it. But not this author, and not this story. So, HarperCollins, return the book to the storage room, shut the door, and revisit the question after Lee’s death, at which point the ripples from your clumsy disclosure will have lost some of their power to harm.

Londres e Washington contra extremismo

Britain and the US are to share expertise on preventing radicalism and tackling domestic "violent extremism". Prime Minister David Cameron announced the move following talks with President Barack Obama at the White House, warning that they both faced a "poisonous and fanatical ideology". The taskforce will report back to the two leaders within six months. Mr Cameron also said Britain would deploy more unarmed drones to help ground forces tackle Islamic State. The prime minister is on a two-day visit to Washington for talks with President Obama, likely to be his final Washington visit before the UK general election in May. At a press conference in the White House, Mr Obama hailed Mr Cameron as a "great friend" while the British prime minister said the US was a "kindred spirit". The talks between the two leaders come a week after the deadly terrorist attacks in Paris which killed 17 people. Concerns over additional attacks by Islamic extremists intensified on Thursday, after two people were killed during a targeted anti-terror raid by police in Belgium, to pre-empt what officials there called a major impending attack. 'Fanatical ideology' UK police have said there is "heightened concern" about the risk to the UK's Jewish communities in the wake of last week's attacks and are considering stepping up patrols in certain areas. At a press conference in the White House, Mr Cameron said: "We face a poisonous and fanatical ideology that wants to pervert one of the world's major religions, Islam, and create conflict, terror and death. "With our allies we will confront it wherever it appears." President Obama said the US, UK and its allies were "working seamlessly to prevent attacks and defeat these terrorist networks". The UK prime minister also announced that the UK will send an additional 1,000 troops to take part in NATO military exercises in the Baltic states and eastern Europe amid heightened tensions in the region following Russia's conflict with Ukraine. Mr Cameron and President Obama were also due to discuss the economy, amid uncertainty in the eurozone and controversy over a planned EU-US trade deal. Mr Cameron was also expected to raise the case of Shaker Aamer, the final British resident in Guantanamo Bay. Ahead of the talks, which lasted just over an hour, it was announced that the UK and US are to carry out "war game" cyber attacks on each other as part of a new joint defence against online criminals. BBC

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

A Fundação Champalimaud

FUNDAÇÃO CHAMPALLIMAUD - acordos Localização: Avenida Brasília 1400-038 Lisboa ATENDIMENTO: Telefone 210480048- TLM 965922748, E-MAIL: centro.atendimento@fundacaochampalimaud.pt A fundação Champallimaud já tem protocolos com a ADSE, IASFA, MULTICARE, MÉDIS, Advancecare,Saúde Prime, Allianz, CGD,SAMS (quadros), PSP- SAD. DIVULGAR CURA DO CANCRO EM PORTUGAL Sinto que esta é uma daquelas informações que não se pode deitar ao lixo sem passar a TODOS amigos e conhecidos. É possível evitar muito sofrimento Curar o cancro com 1 só sessão, em Portugal. Fundação Champalimaud. Tratamento disponível desde 2012 Março. Convém estarmos todos informados. Vejam e divulguem Curar o cancro com uma só sessão, em Portugal. Fundação Champalimaud. Tratamento disponível 2012 Março. Radioterapia que elimina tumor numa só sessão chega a Portugal. Pode eliminar o cancro numa única sessão, mesmo com o tumor já espalhado. É indolor e tem menos custos que a radioterapia convencional. O equipamento chegou à Fundação Champalimaud em 2011 Dezembro equipado com ferramentas que o tornam único no mundo. Uma radioterapia que pode eliminar o cancro numa única sessão, mesmo com o tumor já espalhado,disse o oncologista Carlo Greco. A taxa de sucesso nos tratamentos tem melhorado de ano para ano. Disponível para tratamento no final do primeiro trimestre de 2012, permite tratar muitos dos casos de cancro com metástases, sobretudo os menos disseminados. Sistema absolutamente único em Portugal e, na Europa, há poucos. Trata-se de uma radioterapia por imagem guiada, em que se faz TAC e tratamento em simultâneo. Exige elevado nível de precisão com dose única aplicada no local adequado. Testámos o equipamento e a técnica na Universidade de Pisa, em Itália. Funciona em qualquer tipo de cancro, mesmo num dos mais resistentes à quimio ou radioterapia, como o do rim, com uma taxa de sucesso de 80% mesmo nos casos de cancro dos rins. "É indolor, elimina a toxicidade e consegue-se fazer o tratamento em menos de um quarto do tempo do que as sessões convencionais de radioterapia, i.e., trata quatro vezes mais doentes que a radioterapia tradicional. Em 10 minutos consegue-se o mesmo do que com a cirurgia, permitindo ao doente ir para casa de seguida e sem risco de morte. Oferecemos aos doentes metastáticos, mais do que esperança, uma realidade - sem dor e sem invasão". Tratamento mais barato do que a radioterapia convencional Vamos abrir as portas a todos, recebendo doentes de hospitais portugueses e também de qualquer país da Europa ou do mundo. Por agora, a Fundação só recebe doentes particulares, tendo já acordos com dez instituições com seguros de saúde. O custo para o sistema de saúde é muito mais baixo.